Rangel Alves da Costa*
O clima ainda continua quente, mas não com
aquele calor insuportável de uns quinze dias atrás. O templo nublado, o ar em
maior e constante movimento, bem como as nuvens que se derramam de vez em quando,
tudo isso faz com que a temperatura deixe de ser tão torturante. Mas haveria de
ser assim, eis que as invernadas já se anunciam como salvação.
E salvação não apenas para o homem do campo,
para o sertanejo nas distâncias matutas, mas para todo aquele que espera
melhoria no preço dos alimentos, ter garantido o milho no São João, ter uma
mesa mais farta e com alimento fresco saído da terra. E somente as chuvas para
que o homem se anime para o preparo do solo, o plantio e a colheita.
Por isso mesmo que chega como prenúncios bons
essa mistura no derramamento das nuvens. Mistura porque ainda não chegaram as
trovoadas nem as chuvas mais fortes e constantes, mas apenas uma mescla de
molhação, que vai desde o chuvisco à chuvarada. Eis que o tempo nublado ora traz
apenas uma chuvinha miúda, ora uma chuva mais espessa e também a chuvarada mais
potente e com ventania.
Os dois últimos dias estiveram neste misto
climatológico. As chuvaradas começam a cair na noite, avançando na madrugada,
para depois se transformar apenas em chuvas inconstantes. De repente e o tempo
fecha para que as nuvens despejem as suas águas. Mas tudo muito rápido, passageiro,
diferente do que geralmente ocorre na madrugada, com chuva forte de causar
transtornos e alagamentos.
Nas chuvaradas assim, de barulhar nos
telhados e descer sobre as ruas um véu contínuo de pingos grossos que depois
escorrem pelas vias e inundam canteiros, muitos aproveitam para dormir melhor.
Primeiro ouvem a canção da chuva caindo e em seguida dançam a valsa das saudades
e dos sonhos incertos. Mas outros preferem ficar observando o cair das águas
para viver as nostalgias da noite e reabrir os livros velhos das recordações.
Já os chuviscos tomam conta de parte da manhã
e da tarde. Quase não encharcam ninguém, não formam poças nem impedem que as
pessoas saiam de suas casas, mas também não garantem que cabelos não sejam
desarrumados e elegâncias desfeitas, vez que todos parecem sempre iguais
andando apressadamente, cabisbaixas ou portando guarda-chuvas. E as ruas são
tomadas de pessoas assim, numa correria danada para fugir dos chuviscos.
Verdade é que enquanto uns louvam a Deus
pelas bençãos das chuvas, outros se dizem chateados com a molhação. Muitos
preferem caminhar molhados de suor a sentir pelo corpo os pingos leves que
caem. É uma questão de não querer aceitar as necessárias transformações.
Ademais, se as chuvas nada significam para muitos que moram nas cidades grandes
e têm o asfalto por chão, diferente ocorre com os viventes dos sertões e das
brenhas esturricadas.
Se para o homem urbano as chuvas podem trazem
transtornos, resfriados e outras doenças, além de impedir tantas práticas no
conforto de seu dia a dia, para o homem do campo tais concepções possuem
norteamentos muito diferentes. É no pingo d’água que mora sua esperança de sua
sobrevivência, é na gota de chuva que está a possibilidade de um amanhã sem
esmolas ou padecimentos, é na trovoada que vem toda sua seiva de vida.
No sertão de onde vim, basta que as nuvens
escurecidas se aproximem e os olhares já fazem a festa da esperança, os olhos
marejam quando caem os primeiros pingos e tudo fica perfumado pelo cheiro que
vai subindo da terra com a molhação. Coisa linda de se ver é o sorriso
sertanejo em momentos assim, onde goteira se torna motivo de alegria e as correntezas
vão levando os acúmulos de sofrimentos por causa das estiagens.
Mas mesmo a insensibilidade tão própria da
cidade grande não ofusca o encantamento trazido pelas águas da estação. Seja
através dos chuviscos, chuvas ou chuvaradas, há um tempo que se renova, se
banha e se inunda para dias melhores. Igualmente ao ser humano que toma banho
para se limpar e se sentir mais refrescado, o tempo também sente a necessidade
dessa renovação. Por isso esses pingos que ouço lá fora e me fortificam por
dentro.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
Oi, bom dia! A chuva sempre nos traz reflexão, ela vem para renovar o homem em todos os sentidos, assim como cada uma das estações. Graças a Deus choveu esses dias aqui em na minha cidade. Ufa! Estavamos mesmo precisando. Desejo a vc um belo dia. Um abraço.
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