Rangel Alves da Costa*
Não somos feitos da mesma matéria, pois
guardamos em nosso corpo células, tecidos e sistemas orgânicos, mas igualmente
a produtos e substâncias também possuímos nosso prazo de validade. Não somente isso,
pois também somos retirados das prateleiras da existência.
Somos originários de uma fábrica, que é a
família; temos uma marca, que é o nome; possuímos aparências na cor da pele, no
cabelo, na estatura, no comportamento, no aspecto físico; caracterizamos-nos
por qualidades e aspectos positivos ou negativos; trazemos etiquetas e rótulos na
roupa que vestimos, no calçado que calçamos, nas indumentárias que usamos;
trabalhamos um marketing pessoal de aceitação; e somos cotidianamente expostos
em tudo e a tudo. Contudo, o que realmente nos diferencia das outras coisas
fabricadas é o nosso prazo de validade.
Nos produtos e substâncias, o prazo de
validade é visivelmente exposto: “válido até...”, “melhor consumir em... dias ou
meses”, “produto com vencimento em...”. Com o ser humano é diferente, não nasce
com um tempo determinado de uso, não tem uma data prevista para ser descartado.
O tempo de uso do homem surge de seu nascimento com vida, prorrogando-se até a
morte, que também não se constitui no término de seu prazo de validade. Este
pode ter um limite bem antes, ainda em vida, mas também pode prolongar-se para
a posteridade.
O prazo de validade do homem é aquele que vai
do nascimento até o instante que deseje, que escolha para colocar um ponto
final no reconhecimento de sua existência perante o meio social. Muitos cruzam
todo o percurso da vida sem dar validade alguma à própria vivência. Outros
continuam lembrados e reverenciados mesmo após o instante final. Mas no sentido
do que o homem é capaz de construir, tudo supera a morte. O desaparecimento
total simplesmente não existe para os que deixam marcas positivas na vida.
Conheço pessoas com idade bastante avançada e
que estão com os seus prazos de validade ainda em pleno vigor. Feito crianças,
deixaram de se preocupar com bobagens; feito adolescentes, gostam de brincar e
se divertir; feito adultos, por um lado ainda lutam para alcançar os objetivos
não concretizados, ainda sonham em construir agora para ter dias melhores, e
por outro lado têm a consciência de que os tempos difíceis exigem de cada um
cautelas e limitações. E como idosos procuram fazer valer seus conhecimentos,
suas sabedorias de vida e suas responsabilidades com relação a tudo que os
rodeia.
Ouço falar e leio sobre pessoas que fizeram
com que suas vidas tivessem eterna validade. Partiram, porém deixaram exemplos
grandiosos. Um dia foram erroneamente
chamados de velhos, hoje são reconhecidos pelas suas incessantes lutas perante
as mais nobres causas. Desse modo, indagaria: Oscar Niemayer, Frei Miguel dos
Capuchinhos, Gandhi, Padre Pedro, Madre Teresa de Calcutá, Irmã Dulce e João
Paulo II, só para citar alguns, perderam seus prazos de validade?
Quem sabe envelhecer procura cuidar-se e
insiste em viver ativamente, sempre estará produzindo diante de suas
possibilidades e participando do melhor que a vida possa oferecer. Nada pior que
envelhecer e ainda vivo tornar-se esquecido ou quase uma lembrança que se
dispersa rapidamente. Por isso, urge compreender que envelhecer é um estado de
espírito. Conserva-se jovem aquele que mantém seu espírito altivo, está sempre
alicerçando novas perspectivas. Conserva-se jovem aquele cujo prazo de validade
jamais está perto do fim.
Não é difícil encontrar jovens que na fase
mais produtiva da vida já perderam suas substâncias, suas perspectivas de
construção e logo cedo entraram em labirintos de difícil saída. O uso de
drogas, a prática de crimes, a vida desregrada pelo álcool, além das opções em
não seguir os normais caminhos da existência, tudo isso faz com que o espelho
se quebre mais rapidamente. Muitas vezes não se marginalizam cedo demais, não
morrem cedo demais, é que escolheram não dar nenhuma validade à vida.
Assim, todos que buscam incessantemente
preservar seus prazos de validade, que sigam construindo seu alicerces terrenos,
pois, como ensinou Mário Quintana, de validade eterna, em “A Idade de Ser
Feliz”: Existe somente uma idade para a gente ser feliz. E acrescenta:
Somente uma época na vida de cada pessoa em
que é possível sonhar e fazer planos e ter energia bastante para realizá-los, a
despeito de todas as dificuldade e obstáculos. Uma só idade para a gente se
encantar com a vida e viver apaixonadamente e desfrutar tudo com toda
intensidade sem medo nem culpa de sentir prazer. Fase dourada em que a gente
pode criar e recriar a vida à nossa própria imagem e semelhança e vestir-se com
todas as cores e experimentar todos os sabores. Tempo de entusiasmo e coragem
em que todo desafio é mais um convite à luta que a gente enfrenta com toda
disposição de tentar algo novo, de novo e de novo, e quantas vezes for preciso.
Essa idade tão fugaz na vida da gente chama-se presente, também conhecida como agora
ou já e tem a duração do instante que passa...
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
Me gusta como lo expresas.
En verdad somos productos defectuosos y con fecha de caducidad, ni más ni menos.
Feliz semana
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