Rangel Alves da Costa*
O dia dos mortos ou de finados, ainda que sob
a mesma motivação, possui feições diferenciadas mundo afora, segundo os
costumes e a cultura própria dos povos. Alguns fazem da celebração uma
verdadeira festa, outros reservam o dia para prantear a saudade daqueles que já
partiram da vida terrena.
Em muitas culturas acredita-se que nesta data
os mortos retornam para visitar os seus. Daí que seus túmulos são ornamentados
para a chegada e as residências também preparadas para a visita. Bebidas e
comidas são providenciadas fartamente para que o morto sinta que continua sendo
prestigiado perante seus parentes e amigos.
Outros povos preferem visitar os túmulos de
seus falecidos e expressar todo o sofrimento pela ausência, ainda que já tenha
passado muito tempo desde a sua despedida. Além do sofrimento íntimo, da dor
que nunca cessa de ser sentida, chegam aos cemitérios carregando flores, velas
e outras recordações. E as preces, as lágrimas e os diálogos silenciosos
perante o túmulo.
A cultura brasileira adota o culto ao dia de
finados com a celebração de missas e visitas aos cemitérios. A maioria chega
perante os túmulos para cumprir um ritual de dor e sofrimento. Muitos insistem
em não querer acreditar que aquilo tenha realmente ocorrido, afirmando da
injustiça da morte e sempre se dizendo levados também com o pranteado. É a não
aceitação da morte que se destaca na maioria das visitas aos túmulos.
Já outros, convictos desse destino de todos –
ainda que tal certeza não minimize a dor da perda -, se veem na oportunidade de
expressar todos os sentimentos. E silenciosamente oram, conversam com os seus,
enfeitam os túmulos, renovam fotografias, fazem limpeza ao redor, choram todas
as lágrimas merecidas, e despendem grande parte do dia no ritual de aproximação
com o além, com os seus ali presentes, ainda que tais presenças sejam apenas
sentimentais e espirituais.
Noutros tempos, o dia de finados era
verdadeiramente tido como um dia pesaroso, triste, sombrio, de faces
entristecidas e lenços sempre molhados. Os rádios possuíam programação especial
e a todo instante falavam sobre os artistas falecidos e tocavam seus maiores
sucessos. As missas nas igrejas e nos cemitérios também ficavam repletas em todos
os horários de celebração.
Hoje, em muitos aspectos, não possui a mesma
feição, com a maioria tendo a data como um dia qualquer. A verdade é que muitos
sequer recordam os seus falecidos, fazem uma prece, acendem uma vela ou expressam
qualquer saudade. Os cemitérios não são mais visitados como antigamente e
grande parte dos visitantes fazem o tal percurso como um mero dever de ofício
familiar.
Nas grandes capitais, não é raro que pessoas
deixem os seus ao esquecimento, sem uma flor ou uma vela sequer, e prefiram
visitar os túmulos de artistas famosos e falecidos importantes. Por isso mesmo
que os túmulos, jazigos e mausoléus sempre com acúmulo de coroas, buquês e
mensagens escritas. Neste caso, muito mais que a dor pela perda ou pela saudade
sentida, o que se presta é uma homenagem de reconhecimento.
Mas ainda existem pessoas que sofrem a cada
dia, desde o instante da perda, e muito mais no dia de finados. O sofrimento,
que já é grande na própria residência e diante das relembranças, memórias e
fotografias, aumenta ainda mais quando chega diante do túmulo e sente a
distância separando agora aquele que sempre esteve ao seu lado. Daí a
justificativa da dor, da lágrima, do indescritível sofrimento.
Não sei se o mundo envolto em transformações
e de fragilidade dos sentimentos, mais tarde consiga amenizar a dor da perda de
um ente amado e também do seu culto ao longo dos anos. Difícil que assim
aconteça, mas tudo dependerá do amor e do respeito íntimo de cada ser vivente.
Mas sei que a vida deve à morte ao menos uma
flor, uma vela acesa, ainda que muitos falecidos tenham encontrado jardins e a
luz divina ao redor.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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