*Rangel Alves da Costa
“Venham até a borda, ele disse. Eles
disseram: Nós temos medo. Venham até a borda, ele insistiu. Eles foram. Ele os
empurrou... E eles voaram”.
A belíssima frase acima é do escritor e poeta
francês Guillaume Apollinaire. E nela está demonstrada a força humana ante o
perigo. Ou a capacidade de vencer os obstáculos tidos como insuperáveis.
Chamar até a borda e eles se recusarem a ir
por medo. Novamente chamar até a borda e eles seguirem pela insistência. E já à
borda, sem tempo de qualquer diálogo ou confabulação, simplesmente serem
empurrados. E de repente a queda de cima pelos espaços vazios.
Mas sem que vagassem pelos espaços vazios
entre a borda e os desvãos abaixo, pois bastou o impacto do empurrão e logo
eles encontraram a única solução que os livrassem do pior: o voo. Mas sequer
sabiam que seriam empurrados, sequer sabiam voar, e então como voaram?
Há neste ímpeto de voo uma máxima simbologia.
Ou mesmo muitas simbologias a partir de uma mesma situação de voo repentino,
num bater de asas como única salvação para se fugir do abismo. E o que
realmente significa tal voo?
Eles não sabiam voar, mas foram
repentinamente empurrados e se sentiram capazes de voar no instante mais
desesperador que podia existir. O que os salvaria senão o voo? Eis o tino
humano em busca de soluções em instantes de aflição e sempre encontrando um
meio de salvação.
Ante o perigo real, o voo como o encontro da
instintiva força humana. Ante o empurrão inesperado, o afloramento ligeiro da
capacidade de encontrar uma solução a todo e qualquer custo. Certamente eles
não voariam se não fossem empurrados.
Certamente eles não voariam se não fossem
empurrados por que não instigados a agir assim. Eis, então, o confronto entre a
comodidade e a necessidade. Aquele que só caminha nunca vai saber que também
pode voar. Aquele que se contenta somente com a planura do chão jamais
conhecerá a beleza das nuvens.
A verdade é que todo ser humano possui asas e
sabe voar. A verdade é que toda pessoa tem a capacidade de abrir suas asas e
alcançar outros horizontes. Não apenas em instantes desesperadores, mas a todo
o momento que deseje fluir sua capacidade de realizar.
O voo após o empurrão se situa no mesmo
contexto de outras situações. Ante a sede, bebe-se lama. Ante a fome, se farta
de folhagem e de qualquer coisa. Ante o desespero, qualquer saída é sinal de
salvação. Estando em jogo a própria existência, então o homem inventa-se dentro
de possibilidades antes desconhecidas em si mesmo.
Ainda assim, acaso eles não fossem empurrados
e a queda se desse por um descuido qualquer ou por desejo próprio, certamente
que não encontrariam tão rapidamente aquela saída do voo. Somente voaram por
que foram empurrados.
E sendo tão traiçoeiramente empurrados, então
o susto. No susto, o desespero. No desespero, a busca de qualquer luz. Em
quantos instantes aflitos assim o homem tem que encontrar as mais rápidas
saídas para não sucumbir? Ou faz fruir toda a sua capacidade ou simplesmente
desaba.
Há nesse voo uma grande lição: A capacidade
de voar deve ser conhecida pelo homem antes mesmo de qualquer situação
desesperadora. E assim por que se corre o risco de as asas não abrirem no momento
que mais necessitar de um voo que garanta salvação.
E as mesmas palavras dirigidas a você, tão
temeroso e amedrontado: “Venha até a borda, ele disse. Você disse: Eu tenho
medo. Venha até a borda, ele insistiu. Você foi. Ele o empurrou... E você voou”.
Você teria sido encorajado a voar se não se
visse na iminência da queda, de despencar da borda do penhasco? Você se
sentiria com tamanha capacidade de vencer aquela tão nova e difícil situação se
não fosse instigado a isso?
Agora a vida lhe dizendo: “Suba ao ponto mais
alto do penhasco e depois se atire abaixo, de modo a encontrar seu destino de
vitória. Você diz: Mas eu tenho medo. Suba logo até a beirada e pule, a vida ordenou.
Você subiu. Forças invisíveis o empurraram... E você naquele instante, já em
queda livre, criou asas para voar e no voo alcançar outros horizontes, e nos
horizontes vencer as demais dificuldades impostas pela vida”.
Agora saiba que perto de você sempre há uma
borda. E que alguém pode lhe empurrar a qualquer momento. Cadê suas asas?
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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