*Rangel Alves da Costa
Zé Aroeira
é um sertanejo já passado dos noventa, mas que nem parece ter cinquenta anos.
Todo dia ainda bota a mão na enxada, no facão, no enxadeco, em tudo que
precisar. Ajeita cerca, limpa pastagem, planta palma, lança mão do gadanho para
limpar as folhagens caídas. Acaso preciso, sobe no cavalo magro ou jumento
atrevido e vai dar conta do problema na distância que for. Ainda toma uma
pinguinha antes do almoço e ao entardecer, aperta o dedo na viola de pinho e
cantarola uma saudade danada. Come de tudo. Não nega o sarapatel nem a carne de
porco, não foge da rabada nem da feijoada. Lambe os beiços e estende a cuia
querendo mais. Mas dizem que, por que conversa sozinho, está ficando broco,
perdendo o juízo. Mas não. Aí está o seu segredo de eternidade. Desde a
mocidade que gostava de conversar sozinho, num diálogo era como num íntimo
confessionário. Depois, sem prestar atenção nas baboseiras tidas por um e
outro, passou a conversar com o mato, com a água, com a terra seca, com a
pedra, com o sol, com a lua. E é como os verdadeiros amigos estivessem sempre
presentes para ouvir suas alegrias e seus desencantos. Por isso toda essa paz e
todo esse vigor, essa invejável pujança de vida.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário