*Rangel Alves da
Costa
As
bandeiras brancas tremulam pelos mais diversos organismos internacionais e nas
sedes governamentais e de poder mundial. Pombas da paz estampam bandeiras,
livros, murais e muros, enfeitam paredes, estão presentes em camisetas, em
papéis timbrados e panfletos. Inúmeras são as legislações preconizando a paz
como anseio mundial e determinação de convívio entre povos e nações.
Mas onde
estará mesmo a paz mundial, onde será mesmo esse tão propalado mundo da paz?
Somente nas utopias, nas quimeras e ilusões, torna-se possível avistar uma
realidade ao menos de justiça, de dignidade, de comunhão, de fraternidade e
respeito ao próximo. Contudo, as utopias foram, desde muito, desmitificadas
pelas durezas do mundo real e vividamente presente entre povos e nações.
Significa, pois, que o mundo da paz simplesmente não existe em lugar algum.
Os
organismos internacionais e seus tratados de paz jamais conseguiram impor
qualquer medida neste sentido. Os países signatários simplesmente assinam
simbolicamente a aceitação e depois simplesmente colocam os considerandos e os
preceitos debaixo da sola dos sapatos. Igualmente ocorre com relação ao clima,
à proliferação de armas nucleares, à erradicação da miséria e da pobreza, ao fim
do trabalho escravo, o respeito às minorias, dentre tantos outros, que acabam
tendo pouquíssimas consequências nas suas políticas.
Mas onde
estará mesmo o tal mundo da paz? Olha-se de canto a outro do planeta e o que se
avista é de causar espanto e medo. Como pode haver paz num mundo onde a fome
afeta e mata milhares de pessoas todos os dias, onde as epidemias mais simples
de serem combatidas ainda provocam dizimações de comunidades inteiras, onde a
escravização infantil e adulta ainda persiste acontecer, onde a miséria e a
pobreza continuam tornando insuportável o viver em meio à falta de saneamento
básico, de postos de saúde e medicamentos?
Certamente
Hitler e Stalin queriam um mundo de paz para suas nações. E uma paz que somente
seria possível com mortes e trucidamentos de milhões de pessoas. Os campos de
concentração, as trincheiras de guerra, as perseguições, as mortes nos paredões
e demais tipos de execuções, foram algumas das políticas adotadas em busca
dessa paz interna e da expansão do poder perante as demais nações. Daí
indagar-se: pode haver paz quando os objetivos da paz primeiro passam pela
morte, pelo sangue e pelo terror?
Pacificar
o mundo através da religiosidade dos povos sempre foi acreditado por muitos,
porém impossível de acontecer, como bem demonstram as lutas religiosas, as
guerras santas, o terrorismo fanatizado, onde a cruz e a fé são trocadas pela
espada, pela arma e pelo covarde ataque. Até mesmo as Cruzadas foram
reconquistar as terras santas através das armas, pelas armas foram recebidas e
pelas armas tiveram seus desfechos infrutíferos. Quando expedições e exércitos
cruzavam fronteiras levando à frente a cruz real, que não se imagine a ausência
da sanha sangrenta no afã de conquistar.
Que paz é
esta que campeia nos campos de refugiados, nos povos apátridas, nas etnias que
são vistas e tratadas como asquerosas? Que paz é esta que faz uma população
inteira fugir pelos mares e morrer entre as águas em busca da salvação em
qualquer terra, que vitima velhos e crianças e que separa famílias inteiras?
Que paz é esta que impõe toque de recolher, que sequestra jovens e adolescentes
e espalha o terror por tribos e comunidades inteiras? Que paz é esta passa em
facão o ódio exacerbado, que vitima qualquer um sem qualquer causa que
justifique, que atrai menores para a guerra e o terrorismo?
Que paz é
esta que assola o mundo africano e faz de seus pequeninos uns seres rastejantes
em busca de qualquer grão, que não permite que a vida dure mais do que apenas
alguns anos, que não dá esperança de hoje nem de amanhã? Que paz é esta
incendeia o que encontrar, que corta cabeças, que coloca em mira desde a
infância à velhice, que dizima civilizações inteiras em nome do ódio, do medo e
da violência? Que paz é esta que torna nações ingovernáveis e governos em
tiranos, povos em escravos e todos em busca de razão pra viver? Que paz é esta
que sempre vê no outro um inimigo, que faz de qualquer um inimigo, que desconhece
totalmente o ser em sua existência e dignidade?
Será este
o mundo da paz? Verdadeiramente jamais será paz apenas a intencionalidade, o
sonho de ter o mundo em comunhão, a esperança de que os povos se respeitem
mutuamente. Não haverá paz enquanto as guerras forem tidas como mais lucrativas
e os egoísmos governamentais forem mais importantes que o respeito às demais
nações. Não pode haver paz no mundo onde a violência é alarmante, onde a
insegurança prospera por todo lugar e onde o cidadão não se sente seguro sequer
dentro do próprio lar. Não cabe a paz onde as leis são injustas e os julgadores
mais injustos ainda.
Sim,
talvez haja um mundo de paz. No coração daquele que teme até abrir a porta para
abraçar o sol. A paz inalcançável num mundo de todas as guerras.
Escritor
Membro da Academia de Letras
de Aracaju
blograngel-sertao.blogspot.com
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