Rangel Alves da Costa*
Acaso fosse ele, certamente que seria meia
hora para escrever o título acima. Teclava o “c” e apareceria “n”, apertava o
“d” e surgiria “b”. O teclado apanharia como nunca. E tudo por culpa dele, até
mesmo as palavras que só surgiriam tortas, incompreensíveis, cheirando a limão.
Quanto às bebidas, impossível lembrar os nomes.
Ao invés de deitar, de dormir para ver se
chegava a cura pro porre, ele resolvia fazer besteira: sentava diante da
máquina para escrever devaneios. E sempre aparecia um monte de idiotices, de
besteiras mesmo, e o pior que tudo como se tudo fosse de uma profundidade
incrível. Um texto literário correto, importante, verdadeiro exemplo de lúcida
criatividade.
Que nada. Tudo porcaria, coisa pra
envergonhar se houver leitura no outro dia. O problema é que se corre sempre o
risco de escrever um monte de porcaria, achar que está uma pérola e em seguida sair
publicando por aí. Então será o fim, pois o mundo inteiro vai tomar
conhecimento da lástima que foi escrita.
Só tem uma coisa boa nisso tudo, algo que não
se deve deixar de admitir como genialidade, que é a coragem de vomitar de uma
só vez tudo aquilo que por tanto tempo teve medo de escrever.
“O que posso fazer pra aquela porra entender
que gosto dela. Só me falta arrancar um pedaço do céu, roubar uma estrela,
cortar um pedaço de lua pra jogar pela sua janela. Já dei anel, dei brilhante,
dei o que não podia dar. Cada anel tentando agradar é menos duas calças e duas
camisas pra mim. E isso quando o anel é barato. Achei de comprar um presente
dourado e até hoje vivo endividado feito um filho da puta. Faço isso tudo, me
lasco, passo necessidade por causa dela e aquela zinha ainda fica botando
banca. Vou ainda acabar correndo o risco de vê-la passar toda chique com tudo
que dei, mas de mãos dadas com um pé rapado, um zé-ninguém. Mulher não tem jeito
não. Se a gente é bom demais, ainda assim é ruim. Se é ruim vem logo a desculpa
pra dar um chute na bunda. Sorte daquele que tem a sua sem precisar se
endividar com o mundo. Mas desde que exista algum”.
“Fico puto da vida com demagogia religiosa.
Não conheço um que não se diga temente a Deus, religioso demais, fazendo o
percurso de vida segundo as lições bíblicas. Tudo picareta de marca maior. Até
que frequenta a igreja, diz ser católico ou evangélico, sabe discutir alguma ou
outra coisa da Bíblia, mas quando enxerga o dito pelo avesso vive mais em
pecado do que ladrão de moeda de cego. Pra que frequentar igreja, se dizer
religioso, temente a Deus, se não vale nada, não presta de jeito nenhum? Esse
mesmo que se faz de bom moço não passa de um mal intencionado, de um covarde
que vive falando da vida dos outros por trás, que não respeita a si mesmo nem a
ninguém. Nunca vi dizer que uma pessoa saísse de uma missa e fosse pra casa de
amante, fosse tomar cachaça e falar mal de todo mundo, fosse paquerar menina
nova e mulher casada, fazer o que não presta pelos quatro cantos. O mesmo se
diga dessas nojentas dessas falsas beatas e dessas que se encobrem toda de
roupa e quando guardam o terço e o rosário vão fazer safadeza. Por isso é
melhor ser como eu, que não boto pé em igreja pra tá ouvindo conversa fiada de
padre pedófilo e cheio de safadeza”.
“A porra desse mundo tá todo errado e desde
muito tempo. Não é possível que não percebam que essa merda não vai suportar
por muito tempo o que os seus inquilinos andam fazendo. Antigamente ainda havia
respeito, família se respeitando, pessoas educadas, boas práticas de
convivência e outras coisas que ainda davam um gostinho em viver e se
relacionar. Mas com o passar do tempo tudo começou a desandar. Quanto mais
chega a ciência com o seu progresso mais o homem regride na sua condição
cidadão, na sua essencialidade humana. Como máquina não vai mesmo mudar a cabeça
de ninguém, pois provado está que o conhecimento não serve muito para o bem da
humanidade, será preciso algum cientista maluco inventar qualquer coisa, assim
como uma máquina que reconheça a mente de cada um e apague de vez todo aquele
que não esteja servindo pra nada ou apenas viva com más intenções. Daí uma boa
varrida no mundo, mas de modo que a poeira da imprestabilidade não contamine os
que ainda merecem ficar. E talvez apenas uns dois ou três dentre esses bilhões
de imprestáveis que povoam o mundo”.
Ainda bem que nunca mais bebi e não tenho
nada a ver com isso.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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