Rangel Alves da Costa*
A vida é pressa, é correria. Então se apresse
gente, corra, vá. Há um relógio marcando, um trem apitando, um trânsito
terrível, uma estrada distante, um longo caminho.
Comumente se diz que a pressa é inimiga da
perfeição, que não adianta correr, pois tudo sempre acontece como tem de
acontecer.
E também frequentemente se diz que não
adianta ter pressa se tudo acontece apenas no momento certo. E ainda que a
realidade da vida sempre obedece a uma lógica que jamais pode ser modificada
pela ação precipitada do homem.
Contudo, o cotidiano desmente as teorias, o
vai e vem do dia a dia refuta as lógicas, as exigências da vida transformam
todos os métodos e itinerários. E quase tudo passa a ser na demanda do acaso,
das exigências surgidas perante cada situação.
Por mais que a pessoa se comprometa a não se
apressar, a ter calma e comedimento em tudo, logo se verá diante de urgências
que revertem todas as expectativas. Assim ocorre porque acontece muito mais na
vida do que imagina o indivíduo realizar.
E não somente os acasos modificam as ações,
transformam os planejamentos. O simples ato de viver exige busca intensa,
procura incessante, açodamento, afobação. As realidades passaram a exigir tanta
pressa que até se tornou impensável deixar o tempo simplesmente passar.
Desde o anoitecer ao alvorecer, desde o
amanhecer ao correr do dia, tudo chama à rápida realização. Quase não há tempo
para pensar duas vezes, para o descanso, para o repouso. Ou faz agora ou já
será tarde demais, ou acelera para fazer ou não terá tempo para outros
afazeres.
Não há mais lugar para a lógica do homem
consigo mesmo. O indivíduo não mais se dá o direito de escolher os momentos
mais oportunos para suas realizações. Ninguém pode mais adiantar o que deve ser
feito agora sob pena de não mais ter outra oportunidade.
É o trabalho que chama, é a doença que exige
correria, é o tempo curto demais para tanta coisa ser feita. É o que foi
esquecido e retornou à lembrança, é a necessidade de se apressar para chegar
primeiro, é a precisão que faz do homem um verdadeiro desembestado na vida.
Não há tempo nem para pensar. O relógio se
torna um inimigo cruel, pois sempre dizendo que está atrasado, que precisa
seguir, que precisa chegar. O calendário um desafeto voraz, pois sempre
marcando os compromissos, exigindo que se apresse, que não esqueça, que precisa
obedecer aos seus ditames.
O próprio pensamento do homem acaba sendo seu
algoz. Deita para descansar e acaba lembrando os compromissos, as contas a
pagar, os atrasados, as preocupações e sofrimentos. E assim vai criando a
certeza que desde muito se escravizou pelas obrigações. E logo ao levantar se
vê na dúvida do que primeiro fazer após sair pela porta, vez que são muitas
obrigações para apenas um ser humano.
E assim ocorre com quase todo mundo.
Dificilmente haverá pessoa desobrigada com o relógio, com o calendário, com os
afazeres cotidianos. Sempre haverá alguma coisa que chama e que diz para se
apressar, para correr, para buscar uma imediata resolução. E é por isso que o
último gole de café é tomado quase na porta de casa, pronto para correr mundo
afora.
Então corre porque está atrasado, porque
precisa antes resolver um problema em algum lugar, porque necessita chegar na
hora. Então se apressa porque se vê diante de um só dia para tanta coisa
resolver, para pagar contas, para apostar na loteria, para marcar uma consulta;
enfim, para a normalidade da vida.
E já tarde da noite retorna cansado,
completamente esgotado. Mas antes mesmo de se dar por satisfeito do trabalho do
dia, logo recorda que se esqueceu de uma coisa ou outra. Ou de várias. E tudo
tem de ser resolvido amanhã, sem falta.
Deita pensando e acorda com uma agenda
mental. Não demora muito e já está correndo, se apressando, loucamente vivendo
para fazer, incansavelmente realizar. E um dia simplesmente morrer, e quando
mais se apressava para viver.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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