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quarta-feira, 15 de outubro de 2014

PALÁCIOS, PRAÇAS E SOMBRAS


Rangel Alves da Costa*


Os governantes de Sergipe e de Aracaju desde muito que mudaram de endereço. O antigo Palácio Provincial inaugurado em 1963, e Palácio Olímpio Campos desde 1954, localizado na Praça Fausto Cardoso, deixou de abrigar a governança estadual desde os idos de 1997. O último governo que ali despachou foi o de Albano Franco. Passou por reformas e atualmente abriga o Palácio-Museu Olímpio Campos, mantendo preservado nas suas dependências um importante acervo não só da história política e cultural sergipana como de seus governantes.
Após a fachada neoclássica, adentrando na imponente construção logo se pressente uma atmosfera de tempos distantes e mais recentes, num contexto envolvendo os meandros do poder, dos enlaçamentos políticos, das posturas dos governantes. Ali ainda os ecos das ordens, das urgências, das decisões que provocaram grandes mudanças na vida política sergipana. Ainda as sombras das revoltas, das ameaças, das sublevações. Os salões suntuosos, as salas de reuniões, os gabinetes, as madeiras de lei envernizadas pelas mãos assinando a história.
A atmosfera política é atenuada pela profusão artística encontrada desde a entrada. Os painéis de Jordão de Oliveira, bem como as pinceladas de outras artistas emolduradas nos ambientes, passando pelas escadarias e enveredando pelos seus cômodos, demonstram a riqueza palaciana e a importância cultural e histórica em cada espaço, mobiliário ou obra de arte. Mas também lembranças de um tempo de tenacidade e até violência. Muitos foram os conflitos, conspirações e traições sangrentas que rondaram seus arredores, subiram suas escadarias e colocaram em perigo o poder. E até o destronaram algumas vezes.
Foi ainda num de seus aposentos que na madrugada do dia 02 de abril de 1964 o então governador Seixas Dória foi despertado para ser preso, acusado de subversão pelo regime militar então instalado e enviado para a Ilha de Fernando de Noronha. Pelos arredores a voz de Fausto Cardoso bradando contra a oligarquia do monsenhor Olímpio Campos e tentando demover das forças federais a pretensão de recolocar no governo Guilherme Campos, irmão do religioso senador.  E também o zunido do disparo em sua direção e o seu grito de morte. No ventre ferido, o desfecho fatal e a Revolta de Fausto Cardoso submetida ao poder oligárquico.
Destino inverso teve a sede do governo municipal. Construído em 1923, o Palácio Inácio Barbosa, denominação em homenagem ao presidente da província responsável pela fundação da cidade, está situado um pouco mais atrás do palácio estadual, na Praça Olímpio Campos, defronte ao parque Teófilo Dantas e nas vizinhanças da Catedral Metropolitana. Marcelo Déda foi o último gestor municipal que ali possuiu gabinete e assento. Desde 2005 que teve suas portas fechadas e assim continua, sem uma indicação de sua destinação futura ou possibilidade de novamente abrigar a sede da governança municipal.
Dois monumentos palacianos, sob a justificativa de reformas para adequação dos espaços, preteridos pelos seus governantes. Duas histórias preservadas de modos diferentes, coincidentemente localizados em praças que não se debandaram porque fincadas na terra. Tanto a Praça Fausto Cardoso como a Olímpio Campos se distanciam muito da pujança dos monumentos que abrigam, ainda que o palácio municipal não seja mais avistado senão como uma construção histórica envelhecida, de portas fechadas, ao desvão da voracidade do tempo.
Pela importância histórica e localização, pois centrais na ambientação da cidade, as duas praças mereciam consideração maior por parte da administração municipal, competente que é pela manutenção, reforma e preservação dos espaços públicos. O que se tem, contudo, são promessas de melhorias que nunca são realizadas a contento. Por consequência, o que se avista são espaços contendo apenas palmeiras, árvores imponentes, canteiros verdejantes, revestimentos em pedras, mas sem equipamentos próprios que permitam maior fruição e comodidade de quem as visita ou simplesmente caminham pelos arredores.
São praças solitárias, tristes, silenciosas, parecendo despercebidas em meio ao centro aracajuano. São ambientações retraídas, sem força convidativa alguma para turistas e nativos que por ali transitam apenas como itinerários. Para se ter uma ideia, os dois coretos da Praça Fausto Cardoso tornaram-se sinônimo de desolação. Uns poucos bancos faltando tábuas e nada mais que isso. Contudo, muito mais atrativa que a Praça Olímpio Campos, cujo Parque Teófilo Dantas, na área defronte e aos lados da catedral não possui um assento sequer. E quem já viu praça sem atrações, sem bancos, sem nada além de canteiros e folhas caídas? Distante o tempo dos pássaros e peixes, das águas correndo, das vistosas estátuas dos índios.
Com feição um pouco diferente é a Praça Almirante Barroso, situada entre o Palácio-Museu e da Câmara de Vereadores, em meio às duas praças referidas. Mas muito mais deserta que as demais. Ali palmeiras centenárias, bancos e até mesinhas de concreto, um local apenas de passagem ou de encontros românticos. A qualquer hora do dia casais são avistados pelos bancos aos beijos e abraços, ainda que quase ao lado do velho banheiro público e seus segredos. Mas nada os incomoda, sequer o olhar petrificado, porém vigilante, na vetusta estátua do almirante.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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