Rangel Alves da Costa*
Não há dúvidas que o Eclesiastes é o livro da
vida. Muito mais que relatos bíblicos, lições e sabedorias, nele são
encontrados os fundamentos da própria existência humana. E nele também a
certeza que nada é perene, possui uma só feição, que nada será amanhã na mesma
forma que hoje se apresenta. Daí a mutabilidade nos seres, nas coisas, nas
situações. E por isso mesmo ser um livro de encorajamento e esperança, vez que
sempre mostrando uma porta aberta para que o novo aconteça.
Não apenas de encorajamento e esperança, mas
também de prudência e vigilância é o Livro do Eclesiastes. Precisamente por
mostrar que o que se apresenta hoje amanhã poderá ser visto de outro modo,
deixa induvidoso que o homem deve se precaver para não ser surpreendido com o
novo que inevitavelmente surgirá. É como se pretendesse colocar o homem em
alerta sobre suas próprias ações, vez que mais tarde será cobrado ou
recompensado pelo que praticou num dado momento de sua vida.
Do início ao fim, o Eclesiastes trata da face
e de sua outra feição, do verso e do reverso, do sim e do não em tudo na vida. Não
deixa de possuir um caráter pessimista, mas assim o faz para dizer que as
ilusões humanas não devem se sobrepor às realidades da vida. E assim nega que
as coisas simplesmente acontecem e sempre acontecerão segundo os ditames do
próprio homem. E assim também afirma que somente a retidão nas ações e o amor a
Deus permitem que o destino dos seres se concretize sem mais dores e
sofrimentos.
Numa primeira visão, até poderia se supor ser
um livro com ensinamentos previsíveis demais, vez que comumente o homem deve
reconhecer que tudo muda, tudo se transforma, e por isso mesmo deve estar
preparado para o que mais tarde lhe possa acontecer. Mas não se limita a isso
exatamente por justificar, por dizer o porquê de haver as mudanças e
transformações. Contudo, o mais importante é que coloca o homem como de
fundamental importância perante o seu destino. Deus acolhe e reconhece as boas
ações, mas cabe ao homem mostrar os seus feitos para julgamento.
Basta a citação do capítulo terceiro para que
se comprove a fragilidade e a força da vida, a opulência e a derrocada do
homem, o sentido da permanência e da transformação nos seres e nas coisas do
mundo. E em tudo, no homem, na existência, nas relações de vida. E assim porque
é necessário perecer para renascer, é necessário sentir as consequências das
atitudes para melhor aprender agir. Enfim, o seu objetivo maior é dizer que
tudo passa, tudo é efêmero, que não se deve iludir com as realidades
momentâneas, pois há um tempo para tudo. Mas deixai que fale o Eclesiastes:
“Para tudo há uma ocasião certa; há um tempo
certo para cada propósito debaixo do céu: Tempo de nascer e tempo de morrer e
tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou, tempo de matar e tempo de
curar, tempo de derrubar e tempo de construir; tempo de chorar e tempo de rir,
tempo de prantear e tempo de dançar, tempo de espalhar pedras e tempo de
ajuntá-las, tempo de abraçar e tempo de se conter, tempo de procurar e tempo de
desistir, tempo de guardar e tempo de jogar fora, tempo de rasgar e tempo de
costurar, tempo de calar e tempo de falar, tempo de amar e tempo de odiar, tempo
de lutar e tempo de viver em paz. O que ganha o trabalhador com todo o seu
esforço? Tenho visto o fardo que Deus impôs aos homens. Ele fez tudo apropriado
ao seu tempo. Também pôs no coração do homem o anseio pela eternidade; mesmo
assim ele não consegue compreender inteiramente o que Deus fez. Descobri que
não há nada melhor para o homem do que ser feliz e praticar o bem enquanto
vive...”.
Como observado, não adianta a vida sob a
auréola das vaidades, das presunções, das arrogâncias. Será preciso ter em
mente as lições de que nada é permanente, nada é tão duradouro como se imagina,
até mesmo porque nada se exaure na vida terrena. Será necessário jamais
imaginar que o mar calmo e azul de agora terá a mesma calmaria e a mesma cor
mais adiante. As estações mudam, as folhas perdem sua cor e seu viço para a
morte e o renascimento. Se um dia a primavera, mais tarde a vez do outono. Por
isso mesmo nada permanecerá eternamente do jeito que se mostra diante do olhar.
O sol nasce e o sol se põe, há a alegria do nascimento e a tristeza na morte.
Então, por que o homem não atenta para o
mínimo existencial? Decerto que jamais conseguirá manter o que deseja na forma
que desejar, mas poderá não se deixar surpreender com o que virá amanhã.
Precisa fazer assim para não se contrapor aos planos de Deus, eis que incorrerá
no risco de forçar permanências que não se justificam por si mesmas. E o pior:
ao invés de reconhecer a mutabilidade da vida e assim procurar semear um amanhã
melhor, fará com que não se torne merecedor das boas recompensas que virão. E a
dor não cessará para a chegada do conforto, e a o sofrimento não cessará para a
chegada da paz.
Cabe ao homem decidir. Deus ensinou-lhe como
tudo acontece. E tudo está escrito no Livro de Eclesiastes. O bom grão permite
a boa colheita, e vice e versa, em tudo. E a ele caberá escolher a colheita que
deseja no seu amanhã.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário