Rangel Alves da Costa*
Nesta terça-feira, 30/09/2014, a 2ª Câmara
Cível do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE) deu provimento unânime ao
recurso de Apelação Cível (Processo nº 201200213096) interposto pelo juiz
aposentado, advogado e escritor Pedro de Morais, e reformou a sentença de 1º
Grau.
Cabe recurso para as instâncias superiores,
mas significa dizer que a decisão garante a livre circulação e venda do livro
“Lampião – O Mata Sete”, impedido desde 2011, quando o juiz da 7ª Vara Cível da
Comarca de Aracaju concedeu liminar proibindo o seu lançamento. O autor
interpôs Agravo de Instrumento contra a decisão singular, mas sua irresignação
foi indeferida naquela oportunidade.
Não obstante, o autor reiterou em 2012,
através de Recurso de Apelação, a reforma total da decisão de primeiro grau e
somente agora o colegiado cível do tribunal sergipano julgou o mérito da
demanda, acolhendo seu pleito por unanimidade. A decisão - cujo Relator foi o
Desembargador Cezário Siqueira Neto, o mesmo que já havia negado provimento ao
Agravo de Instrumento interposto por Pedro de Morais em 2011 -, até a noite de
ontem, 30/09, ainda não havia sido disponibilizada na íntegra para consulta,
mas a Agência de Notícias do TJSE informou o seguinte no site do tribunal:
“2ª Câmara Cível reforma sentença e livro
sobre Lampião poderá ser lançado
[...]
Em seu voto, o Relator Des. Cezário Siqueira
Neto entendeu que garantir o direito à liberdade de expressão coaduna-se com os
recentes julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF), em manifesto combate à
censura. “Não é demais repetir que, se a recorrida, autora da ação, sentiu-se
‘ofendida’ com o conteúdo do livro em testilha, pode-se valer dos meios legais
cabíveis. Porém, querer impedir o direito de livre expressão do autor da obra,
no caso concreto, caracterizaria patente medida de censura, vedada por nosso
Constituinte”, esclareceu o magistrado.
Ainda segundo o relator, a garantia básica da
liberdade de expressão do pensamento representa um dos fundamentos em que
repousa a ordem democrática, não cabendo ao Judiciário estabelecer padrões de
conduta que impliquem em restrição à divulgação do pensamento. “Cabe, sim,
insista-se, impor indenizações compatíveis com ofensa decorrente de uma divulgação
ofensiva”, completou.
O magistrado lembrou também que o personagem
principal do livro é uma figura pública – o falecido Cangaceiro Lampião. “As
pessoas públicas, por se submeterem voluntariamente à exposição pública, abrem
mão de uma parcela de sua privacidade, sendo menor a intensidade de proteção”,
concluiu o relator, citando em seu voto a doutrina de Marcelo Novelino.
Para embasar o seu entendimento, o Des.
Cezário Siqueira Neto concluiu que de acordo com o posicionamento do STF, a
superação de antagonismos existentes entre direitos fundamentais resolve-se, em
cada situação, pelo método da ponderação concreta de interesses, cabendo ao
Poder Judiciário, mediante ponderada avaliação das prerrogativas
constitucionais em conflito (direito de expressão, de um lado, e direitos da
personalidade, de outro), definir, em cada situação, uma vez configurado esse
contexto de tensão dialética, a liberdade que deve prevalecer no caso concreto.
“Comungo do pensamento, no sentido de não
caber mais retrocesso há um tempo em que, por conta de um carimbo da ‘censura’,
os autores ficavam impedidos da publicação de obras literárias, peças teatrais,
músicas, e etc, por vezes, de grande conteúdo intelectual. Na atualidade, deve
prevalecer o pensamento da responsabilidade pela manifestação de pensamento,
mesmo porque a própria sociedade se encarrega de dar o devido valor às
publicações, manifestações que contenham conteúdo intelectual”.
Da decisão da 2ª Câmara Cível do TJSE, ainda
cabe recurso para as Cortes superiores.”
Eis, assim, alguns aspectos da decisão.
Deixarei para analisar os fundamentos da mesma após a publicação do Acórdão.
Contudo, antecipadamente afirmo, sem medo de errar, que garantir publicidade a
mentiras, desonrosas, máculas, sem que nenhum embasamento de verdade possa
haver na alegada conduta sexual de Lampião, caracteriza-se como ofensa
irreparável não só à história e à família, como à Justiça e ao judiciário
sergipano.
Mas, enfim, resta dizer que é deveras
lamentável o entendimento do judiciário sergipano acerca do que seja honra e
respeito à imagem da pessoa humana. Lampião pode ser acusado de tudo, e até de
homossexual se assim realmente tivesse sido, mas não dessa forma nojenta e
injuriosa como a ultrajantemente maquinada pelo autor e ex-magistrado agora
favorecido.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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