Rangel Alves da Costa*
O homem que caminha sozinho conhece a sombra
que o acompanha. Ao sol, não se sente desacompanhado; à noite, pode repousar no
colo do amigo.
É preciso conhecer o pássaro que quer ter à
janela. Ao amanhecer são muitos os gorjeios, os voos, os pousos, a festa
passarinheira. Ao anoitecer, os pios agourentos que tramam os desatinos e os
infortúnios.
Necessário não deixar que a solidão torne o
solitário totalmente sozinho. A solidão deve ser convívio, interação da pessoa
consiga mesma, um instante ideal para a reflexão. E não o vazio completo e
angustiante.
O velho e o menino possuem os mesmos sonhos,
os mesmos desejos, as mesmas inquietações. Só que o menino esquece ao
encontrá-los, e o velho tudo faz para que não se dissipem de suas esperanças.
Não há nada mais triste que uma casa
abandonada, uma porta fechada e uma janela ao sopro do vento. E ainda mais
triste alguém dentro da casa e a porta e a janela permanecendo fechadas ao
alvorecer. Não há vida que não mereça o sol da manhã e o perfume novo da
primeira brisa.
Engana-se aquele que egoisticamente imaginar
ser único e absoluto. Possui o nome, mas o sobrenome não é seu. Desde a feição
ao jeito de ser, tudo numa linhagem que remonta aos primeiros familiares. É tal
junção do passado que lhe permite ter uma identidade, mas sem renegar suas
origens e seus laços consanguíneos.
Não há doce ou cocada que não requeira uma
pitada de sal. A doçura extrema acaba açucarando ou tornando com gosto
intragável o adoçado. Por isso que ninguém deseje a alegria incontida, a
felicidade extrema, o prazer sem limite. Instantes de dor e de sofrimento são
como pitadas de sal tão necessárias à vida.
A vida é curta demais diante da eternidade da
morte. Oitenta, cem ou mais anos de vida, mesmo de longa duração terrena, nada
significa aos olhos que se fecham ao além. Ou haverá a morte da morte também?
Igualmente à estrada, a vida nunca segue numa
só direção. A estrada encontra outras estradas e muitas vezes se deixa levar
por outros caminhos. Ou o ser humano sabe a direção que deseja seguir, o mundo
adiante que deseja alcançar, ou logo será levado a veredas difíceis de
reencontrar-se.
A sede adoça a água salobra e a fome torna em
manjar um resto adormecido de pão. Sem fome nem sede, tanto faz que uma jarra
esteja servida sobre a mesa repleta de guloseimas. Mas tem gente que sequer
guarda um copo de água ou um pedaço de pão. E depois retorna faminto e sedento
ao que não existe mais.
Ter medo da chuva é fugir da renovação, da
purificação, da esperança. As ruas se lavam, os campos se molham, as fontes se
enchem, a vida se inunda de águas novas. E não é diferente com o ser humano.
Reencontra seu útero e de braços abertos se faz germinar.
A melancia talvez simbolize a inverdade além
da aparência. O coco talvez simbolize o poder de geração interior. A acerola
talvez simbolize a grandeza na aparência minúscula. O araçá talvez simbolize a
magia além da doçura. O sapoti talvez simbolize o amor quando se torna paixão.
E o homem simboliza o que?
Não há chamado que não tenha resposta. Mas a
voz é sempre menos ouvida que o coração. Quando este fala não há como não
ouvi-lo e possibilitar que tudo silenciosamente aconteça. Assim a palavra silenciosa
da prece, da oração.
O pintor é o mesmo em todas as estações. E a
mesma beleza avistável nas suas paisagens. É apenas uma forma de dar outra
tonalidade à sua pintura quando coloca menos cor no outono do que na primavera.
O sol espalha, alvoroça e queima, como a lua
que retrai, sensibiliza e aflige. Daí a alegria fingida no dia e o sofrimento
inevitável na noite. Eis que a euforia se cansa e se recolhe como tristeza.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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