*Rangel Alves da Costa
Para publicar em jornal, acresci o presente
texto, anteriormente publicado como “Os grilos de Poço Redondo”. E para dizer
que em determinados períodos do ano os bichos, principalmente insetos, costumam
fazer seus festins. Há mosca o ano inteiro, há grilo o tempo inteiro, há inseto
a cada instante, mas de vez em quando cada um resolve deixar a vida do ser
humano insuportável.
As moscas aparecem aos montões nas
proximidades da semana santa. Mesmo antes que os restos dos peixes sirvam como
atrativos, o mosqueiro é tamanho que mais parece que o mundo humano vai se
tornar em mundo de moscas. Igualmente nas proximidades dos tempos mais
chuvosos, de trovoadas ou invernadas, quando insetos com asas passam a tomar
conta de todos os espaços, principalmente ao redor de luzes acesas.
Os sapos, mesmo de outra espécie animal,
também se avolumam depois das chuvas, ganham as ruas, entram nas residências,
criam um enojamento terrível. As muriçocas também escolhem estações para
surgirem em tropas, em batalhões, em imensas e ameaçadoras quantidades. E agora
é a hora e a vez dos grilos.
Em Poço redondo, sertão sergipano, os grilos
chegaram e tomaram conta de tudo sem dó nem piedade. O mundo é deles, a vida é
deles, tudo agora é deles. Durante o dia, escondem-se aos montes pelos cantos e
frestas, em buracos e nos monturos, para reaparecerem em profusão depois do
entardecer. Aos montes, milhares, milhões.
A única diferença desses grilos de agora para
os outros de tocos de paus é a ausência de repetitiva e enfadonha cantoria. Mas
seria o fim do mundo se o enxame fosse acompanhado daquele cricricri
insuportável. Ter uma cidade inteira tomada por cricricris, e na maior altura
do mundo, seria realmente de enlouquecer. Mas ao invés da cantoria se contentam
em arremeter furiosamente sobre as pessoas. Muitas lentes de óculos já foram
espatifadas pelas brutais investidas dos grilos.
Como bem postou o amigo Alisson Lucas no
facebook, “esses grilos em Poço Redondo estão iguais à corrupção no Brasil, não
têm limites. Se tirar as asas eles pulam, se tirar as pernas eles voam.
Indestrutíveis”. A mais pura verdade. Estão por todos os lugares, muito mais à
noite, porém avistados também a qualquer hora do dia, já prontos para alçar
voo, dar rasantes, importunar a vida de todo mundo.
Os grilos, insetos da família dos gafanhotos,
são comuns em todas as regiões brasileiras. Nas fazendas, matas e lugares mais
afastados, é muito comum se ouvir o seu ruído escondido, constante. Aparecem
também nas cidades, principalmente nas casas de paredes de barro. Mas agora
estão em profusão por todo lugar.
Comumente se diz que mesmo tendo asas os
grilos não voam. Ora, voam sim. Voam e dão rasantes, arremetem em fúria em
direção às pessoas, entram pelos cabelos, pelas roupas, debaixo das saias,
causam um problema danado. Outro dia, em Poço Redondo, eu conversava com uma
mulher quando esta repentinamente pareceu possuída.
E estava possuída sim, mas de um grilo que de
repente entrou por debaixo de suas saias e causou um rebuliço danado. De
início, a mulher enrubesceu, tremeu, remexeu as pernas, quis dar pulinhos. Em
seguida se apavorou, pulou, quis levantar a saia, e enfim correu em direção à
primeira porta que encontrou.
Sem saber de nada, sem imaginar que se
tratava de um grilo açoitando entre as pernas da mulher, apenas estranhei
aquela situação. Quando ela correu desembestada, com as pernas meio abertas,
até pensei que uma vontade incontrolável de urinar havia causado aquela cena
toda. Fiquei esperando resposta para o ocorrido.
Não demorou e já voltou sorridente. Foi um
grilo, disse. E ajuntou: Foi um grilo que não tinha o que fazer e entrou bem
debaixo de minha saia. Dada a explicação, continuamos a conversa, o que não
demorou muito, pois logo ela correu novamente, mas não sem antes dizer: De
novo. E dois, agora parece que são dois.
E não é raro que pelas ruas a gente imagine
que as pessoas estão endoidando. Pessoas balançando a cabeça, desgrenhando os
cabelos, só faltando arrancar tudo. Pessoas pulando, querendo tirar as roupas
no meio da rua. Pessoas mantendo a boca fechada por medo de engolir grilos. E
engole mesmo. Teve um que não só engoliu como teve de passar a noite toda
ouvido o cricricri do grilo na barriga.
Assim a vida perante a presença desses grilos
insuportáveis. A acreditar na crença dizendo que os grilos trazem boa sorte,
não haveria lugar mais afortunado que Poço Redondo. Contudo, não parece ser
essa a realidade. Acaso houvesse a tradição de juntar grilos para fritar e
comer, ainda ia, mas no prato sertanejo só vai o que é encontrado no suor da
luta.
E dizer ainda que sábado encontrei aquela
mesma mulher toda vestida de macacão e com touca envolvendo todo o cabelo. E
com um pedaço de pau de mais de metro à mão. Nem perguntei o motivo daquilo
tudo.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário