*Rangel Alves da Costa
Pela razão e pela consciência, vivo além do
bem e do mal para ser estar apenas perante o espelho da realidade. E reconheço
que o espelho sempre quebra ante o que é avistado.
O que me dói é saber que tudo é humano, demasiadamente
humano. Na pele, na carne, na alma, tudo assim aflige como se uma eterna
navalha estivesse abrindo feridas.
Querem fazer acreditar que Deus morreu. Fazem
da morte de Deus uma forma de colocar na mão do homem os destinos do mundo.
Matam a Deus para matar a si mesmos.
O que é a moral senão a inibição do homem
perante seus impulsos e desejos? Será mais moral ou mais imoral o fingimento ou
passivamente aceitar os ocultos que afligem o ser?
Quando o homem castra-se a si mesmo em nome
da moral, certamente que estará apenas alimentando um imoral disfarce. Não se
pode negar ao homem o seu desejo de sentir a si mesmo.
O homem, suposto dono de seu destino, sempre
caminha a uma encruzilhada. E na incerteza, sempre escolhe o caminho que lhe
parece mais fácil de alcançar seus objetivos. Mas ali estará o abismo.
O mal e o bem são inevitáveis. Sempre haverá
o mal e sempre haverá o bem. A procura pelo mal e a busca pelo bem se afeiçoam
ao próprio homem e seu desejo de mundo. Por isso que tanto mal pelo mundo.
O mundo está repleto de interesses ocultos, de
verdades escondidas e odiosas realidades. O homem nunca caminha pelo que seu
olho avista, mas sempre em direção ao que o seu interesse lhe guia.
Não sou um Nietzsche nem sou um Schopenhauer,
mas sinto na alma e por todo o ser as dores do mundo. Talvez o Zaratustra que
há em mim poderia dizer a minha verdade: não há como não ser pessimista ante a
deturpação do otimismo da vida.
Ora, como ter otimismo num mundo onde o
próprio homem matou o seu Deus para do mundo se arvorar? Achando ter dispersado
o rebanho perante a morte de seu pastor, mais adiante o homem tenta reunir cada
cria para as forças de seus mais escusos interesses.
Sim, o homem deve pensar por si mesmo. Mas
será o homem capaz de pensar por si mesmo? O que se tem é um homem fazendo
desse pensar por si mesmo uma forma de fazer com que os outros homens se voltem
para o seu pensamento e se tornem submissos de suas irracionalidades.
O homem deve ser sua própria potência para o
seu próprio florescimento. Nada que brote do homem deve ser para devastar ou
destruir. Contudo, o que se tem no homem senão a demonstração incessante da
capacidade de viver para o mal e do mal praticar a todo instante?
Não sei se assim falou Zaratustra, mas
certamente morava na sua mente a ideia de um jardim escondido dentro de corpos
apodrecidos. Corpos devastados pelas incoerências e jazendo pelas
irracionalidades, porém sem jamais ter a coragem de mostrar qualquer beleza
interior.
Na verdade, o homem não existe. Acaso
existisse, o homem seria o destino do homem, e o seu destino não é somente a
maldade, a desumanidade, a barbárie, o terrorismo, a carnificina. Aquele outro
homem oculto seria não inverso de tudo, porém mais consciente de vida não é
somente para a prática do mal.
Como ter medo de gatos pretos, de escadas no
meio do caminho, de encruzilhadas, se nada disso é relevante na vida? Não há
como se ter medo daquilo que não produza feridas na própria existência. E
somente o homem revestido de gato preto, de escada e de encruzilhada, pode destruir
não só a passagem como a própria vida.
Não há de ser pessimista, vem sua voz me
dizendo. Enquanto isso tanto faz que tudo tanta faça. Enquanto cruza os braços
e adormece a consciência, os lobos descem das estepes para uivar nos umbrais de
suas janelas.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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