*Rangel Alves da Costa
Mariazinha.
Apenas este o seu nome. Todo mundo a chama assim, apenas Mariazinha. Contudo,
tal nome pode ser o de muitas outras mulheres, outras jovens e mocinhas. E
assim por que a vida, os dramas e as alegrias de Mariazinha podem espelhar o
jeito de ser e viver de qualquer outra mulher. Seguem, então, três pequenas
histórias sobre ela.
Encontrei
Mariazinha derreada no umbral da janela e tão triste estava que mais parecia
uma flor murcha em desolação. Aproximei um pouco mais e senti que a bela
mocinha pranteava, então perguntei por que chorava assim, vez que tão bela como
flor na janela, talvez uma Cinderela e dona da felicidade. Mariazinha apenas me
respondeu: “Por nada”. Insisti na indagação e novamente ela falou bem baixinho,
soluçando e com voz quase inaudível: “Por nada. Foi um cisco no meu olho”.
Também entristecido, silenciei algum instante para depois, de costas pra ela,
dizer: “Os ciscos, Mariazinha, causam mesmo um aperreio danado, mas geralmente
num só olho e os seus dois olhos lacrimejam igualmente. Também acho que a
ventania traz muito cisco por aqui. Todos os dias entram ciscos no seu olho,
Mariazinha? Desculpe dizer, mas todo dia encontro você assim entristecida e
chorosa. Toda dia eu passo por aqui e sempre a encontro derramando uma
infinidade de lágrimas. Pode me dizer, sou seu amigo, o que está havendo
Mariazinha? Sei muito bem que a alma possui ciscos inseparáveis, sei muito bem
que a solidão causa ciscos até dolorosos demais. Mas sua lágrima não é trazida
pelo grão na ventania, mas pela felicidade que você deixa que o vento leve.
Chore não. Amanhã voltarei e você poderá me dizer a verdade”. Dei menos de
cinco passos e logo ouvi a voz de Mariazinha: “Mas ele não me quer!”. Era o que
eu esperava ouvir. Então, olhei na sua direção e disse: “Ele tá certo de não
querer. Quem quer uma mulher chorona? Sorria, coloque flor no cabelo, seja a
mais linda do mundo. Depois feche essa janela e vá ser flor. Toda paixão deseja
uma rosa”.
Doutra
feita, mesmo ao longe eu avistava Mariazinha jogando pedaços de papel pela
janela. Certo dia, depois que ela fechou a janela, eu segui até o beiral do
jardim e comecei a abrir cada papelzinho daquele. Coisa feia eu fiz, reconheço,
mas o que eu encontrei justificativa toda minha curiosidade. E assim porque num
papel estava escrito: “Doces os versos que cantam o meu coração. Uma canção tão
bela que resplandecem como um Sermão. Mas quem sou eu para ser feliz assim, se
sei que todo sim em mim é sempre uma desilusão”. E noutro avistei: “Hoje a
borboleta não veio. Hoje o colibri não veio. Hoje a folha seca não veio. Hoje
nem um pássaro nem um madrigal. Ontem tudo estava aqui e hoje nada veio. Será
que eu estou em mim ou também saí?”. E ainda noutra: “Minha boneca de pano
nunca mais falou comigo. Sequer olha para mim e me dá um sorriso. Creio que me
ouviu dizer que gostava muito de boneca de milho, daquelas de cabelos
amarelados e lisinhos. Mas eu estava só brincando. Mas nisso tudo aprendi a
importância de quem nunca nos fala, mas sempre diz tudo. Minha boneca de pano é
minha amiga, a única que tenho. E nada na vida eu faria para enraivecer. Vou
pedir desculpas a ela e deixar que adormeça no meu colo”.
Por fim,
Mariazinha, como sempre, mostrava-se totalmente diferente das outras mocinhas.
Sua janela era sua vida, porém sempre melancólica e entristecida. O que a
diferenciava, contudo, era o desapego a roupa nova, a roupa nova, a enfeites e
brincos, a tudo que fosse modismo. Gostava de andar de pés no chão, totalmente
descalça. Gosta de colocar uma flor no cabelo. Gostar de pendurar no pescoço um
cordão com conchas do mar. Então ficava muito mais bela, muito mais bonita.
Caminhando, na beleza e na leveza de seu corpo, mais parecia uma rosa passando
toda perfumada. Não havia perfume, apenas seu aroma feminino e tão encantador.
Por isso mesmo que é difícil entender por que Mariazinha tanto sofre, tanto
chora, tanto agoniza na sua janela. Mas sei. O amor ou suas armadilhas. O amor
e suas tramas de doer n’alma.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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