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terça-feira, 19 de outubro de 2010

O PROBLEMA DA RAZÃO COTIDIANA (Crônica)

O PROBLEMA DA RAZÃO COTIDIANA

Rangel Alves da Costa*


Informo antecipadamente que o problema da razão aqui citado nada tem a ver com pressupostos, premissas ou postulados filosóficos que envolvam a razão ou a racionalidade. Pelo contrário, a razão aqui analisada é aquela mesma que todo mundo tem enquanto certeza que está sempre com a realidade a seu favor e que os outros estão sempre errados.
Segundo os estudiosos da racionalidade humana, a razão pode ser considerada como a capacidade que o ser humano possui de organizar a realidade na qual ele vive, fazendo com que esta se transforme em algo compreensível e ordenado. É um processo mental do indivíduo em busca do conhecimento e da validação, ou não, do que foi conhecido. É o conhecimento natural, por oposição àquele resultante da revelação ou da fé.
Em termos mais gerais, tem-se que a razão possui o mesmo significado de relação entre o que existe e o que se aceita como existente. É a faculdade de avaliar, julgar, ponderar idéias, raciocinar; é a capacidade de conhecer e compreender; é o funcionamento normal das faculdades mentais, vez que estas raciocinam dentro da normalidade. Daí a afirmação de que o ser humano é dotado de razão.
Contudo, pessoas existem que acham, pensam ou sonham que têm mais razão do que as demais. Para estas, somente o que afirmam está correto; somente o que pensam é o certo; somente o que desejam deve ser aceito. Seja pelo que for, pela desculpa mais esfarrapada que possa existir, ninguém mais na vida, a não ser a própria pessoa ou grupo da qual ela faz parte, tem o direito de estar com a razão em alguma coisa.
E acham que têm razão em tudo e acima de tudo por diversos fatores. Em primeiro lugar, porque acham que seria uma vergonha ou estupidez muito grande dar o braço a torcer quando podem, aos trancos e barrancos, confirmar a realidade daquilo que desejam, mesmo que no íntimo saibam que aquilo tudo está sendo feito por puro egoísmo e vaidade.
Em segundo lugar, porque se acham mais importantes, mais inteligentes e mais poderosas do que as outras. Sendo assim, sendo possuidoras de tais qualidades, seria inconcebível que o mundo não girasse aos seus pés e a vida não lhe servisse por pura obediência e submissão. Ora, se acham que os outros devem obediência, por consequencia devem também impor o que quiserem que não serão contestadas.
Em terceiro lugar, porque existem pessoas que são ignorantes ao extremo, brutas mesmo, chegando às raias do animalesco e que, por não saberem distinguir razão de emoção, realidade e fantasia e até verdade e mentira, fazem como bichos que usam antolhos, ou seja, não podem e nem sabem enxergar por outro caminho senão aquele por eles mesmos traçados.
São inúmeras as situações onde se poderia situar e exemplificar a razão única, a razão negativa, a razão mentirosa ou a razão conveniente, ou qualquer outro termo que se queira, com razão, criar. Contudo, a partir de umas poucas indagações é fácil se compreender até onde vai esse problema da razão cotidiana, como veremos.
Então respondam: Por mais que os filhos tenham agido errado, quantos pais reconhecerão o erro e afirmem que a razão está com quem falou sobre o problema? Numa briga entre famílias, qual a família que tem mais razão que a outra? Numa discussão, em quantos pedaços se divide a razão? Qual é o governante que assume o poder e diz que outro estava com a razão nisso ou naquilo?
Diante desse problema da multiplicidade de razões dentro de uma única razão, há que reconhecer que esse poder natural que possui o ser humano de querer subestimar a certeza do outro a qualquer custo, nada mais é do que pretender se valer de outros instrumentos para esconder um dos seus atributos mais peculiares, que é a mentira.
Ora, a razão forjada sobre tudo e todos é tão mentirosa quanto a própria mentira. Quem age assim, além de não ter razão é mentiroso nato, de si mesmo e na vida.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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