ZEZINHO NO MUNDO E O MUNDO DE ZEZINHO – 7
Rangel Alves da Costa*
Mexendo numa coisinha e noutra, revirando tudo, arrancando as ervas daninhas, cortando galhos e fazendo podagem, Zezinho foi organizando novamente aquilo que havia sido um jardim. Depois disso ainda mexeu na terra antiga e colocou outra nova, adubou e fez algumas replantações. Molhou tudo bem molhado e deu o trabalho por encerrado.
Isso já era pra mais de quatro horas da tarde, depois de ter almoçado na companhia da senhora e ter de falar muito mais do que estava acostumado. Será que ela não tá vendo que isso é conversa pra gente grande, pra adulto? Indagava-se de vez em quando.
Chamou a velha senhora ao jardim refeito e deu algumas explicações de como deveria proceder dali em diante, sob pena de que a maravilha que ela tanta queria se transformasse novamente numa lixeira.
E disse brincando: "Só em ter limpado o jardim já fez com que o Brigadeiro viesse dá uma olhadinha. Ele tava por aí passeando entre os canteiros...". E a velha senhora pareceu acreditar, pois imediatamente falou espantada e com os olhos cheios de lágrimas:
"Você viu ele mesmo? Falou em com ele? Como ele estava? Ele gostava de passear por aqui mesmo ao entardecer, e sempre cantando aquela velha canção napolitana. Sempre cantava e cantava, mas nunca conversava comigo, não sei porque. Mas ele disse alguma coisa a você?".
Aí não teve jeito mesmo e teve que continuar na mentira: "Primeiro ele cantou, mas era outra música que falava em saudade. Depois veio pra perto de mim e começou a falar...". "Me conte, me conte!", pediu a senhora apertando os ombros de Zezinho, em total desespero:
"Bem, ele disse que a senhora não deixe de cuidar do jardim, tenha cuidado com os filhos e netos interesseiros e que plante aqui também umas plantinhas de fazer remédio, daquelas que o chá cura qualquer coisa, que é pra evitar que a senhora vá pra onde ele tá assim ainda tão cheia de vida...".
"E o que ele disse mais, diga, diga!", insistia agora aos prantos de lágrimas corridas.
"Deixe-me lembrar. Ah!, disse mais que a senhora mais tarde fique passeando por aqui que ele vai aparecer novamente. E disse que dessa vez não vai só cantar não, vai também conversar e dizer uma coisa que gostaria de dizer sempre..."
"Diga meu filho, diga!". E balançava o menino como se quisesse tirar a palavra à força.
"Ele disse que me solte que eu digo depois o que ele disse...". A velha se conteve um pouco e o menino continuou: "Ele disse que te ama muito e vai continuar te amando para sempre e cada vez mais".
Mas pra que Zezinho foi dizer isso? A velha abraçou o menino e chorou tanto que este pensava que já estava tomando banho. Pacientemente esperou ela se recompor e depois pediu para tomar um banho de verdade.
Ela mostrou onde era o banheiro e disse que havia providenciado uma roupa nova pra ele vestir. E Zezinho não sabe o momento que ela havia saído pra comprar aquilo tudo, mas a verdade é que ali estava uma bermuda, uma camisa, uma cueca e até um sapato, tudo novinho e bonito demais, cheirando a leite, como ele gostava de dizer.
Depois do banho e se vestir todo, se olhou no espelho e disse a si mesmo que sua mãe iria chorar de alegria, iria dizer que ele estava lindo e viria com um beijo carinhoso. Mais tarde ela poderia fazer isso, assim que a encontrasse na rodoviária, pensou. E estava bonito mesmo, concluiu por conta própria.
"Tome meu filho, eis aqui o seu pagamento, mas não pelo trabalho realizado no jardim, mas sim pelo dia maravilhoso que me deste. Se quiser pode voltar amanhã...". Disse a senhora, entregando um pequeno envelope nas mãos dele, numa profunda feição de agradecimento.
"Mas não posso voltar mais aqui não porque minha mãe está me esperando pra gente viajar. E tenho que ir logo pra rodoviária senão ela fica preocupada comigo. Até e muito obrigado por tudo".
Estavam no jardim, e quando ele deu uma última olhada pelos canteiros, eis que avistou um homem acenando um adeus com cara de felicidade. Só pode ser o Brigadeiro, pensou. E falou baixinho no ouvido da velha senhora: "Olhe ali, o seu Brigadeiro está ali esperando para conversar. Vá lá que hoje ele não vai só cantar, vai também dizer te amo".
E saiu sem olhar pra trás.
Encontrou o ponto de ônibus indicado pelo dono da padaria e enquanto esperava o transporte lembrou do envelope com o pagamento que estava no seu bolso. Foi olhar para ver quanto havia recebido e os olhos ficaram com intenso brilho repentinamente.
Na inocência, foi contar o dinheiro ali mesmo. E não demorou nem um minuto uma mão puxou com violência tudo o que tinha.
continua...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário