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quinta-feira, 29 de setembro de 2016

QUE CONVERSA É ESSA STF? O ESTADO É OBRIGADO SIM A CUSTEAR REMÉDIOS DE ALTO CUSTO


*Rangel Alves da Costa


O ditado é velho, mas sempre válido aos tempos de agora: a saúde no Brasil está no leito de morte. Todos aqueles que necessitem de algum cuidado médico em hospital ou posto de saúde têm de amargar as dores do descaso, da omissão, da falta até de um remédio básico ou de um simples curativo.
Corredores abarrotados de pacientes, doentes jogados em macas pelos cantos e corredores, filas intermináveis para atendimentos. Cirurgias e outros procedimentos, ou aguardam as intermináveis filas ou o doente se vê sem opção: ou contratar atendimento particular ou saber que vai morrer. E o pobre, que não tem qualquer outra solução a não ser submeter a tais desumanidades?
Entra governo e sai governo e a crise na saúde vai aumentando seu grau de risco. Os leitos hospitalares nunca são suficientes à demanda, os profissionais de saúde vivem reclamando das condições salariais e de trabalho (e por isso mesmo atendem mal), falta insumos básicos aos atendimentos, é tudo ao desvão da vida. Além disso, nos centros de fornecimento de medicamentos sempre estão em falta aqueles mais utilizados pela população.
Acaso a doença seja de gravidade reconhecida e de difícil tratamento, como os casos oncológicos, então a situação complica ainda mais. Não só os tratamentos são deficitários como o fornecimento dos medicamentos necessários aos pacientes carentes. Em muitas situações, ante a escusa do Estado no fornecimento, os pacientes, sem poder pagar o remédio, simplesmente não tinham a quem recorrer. Era morte certa.
Perante tal situação, as pessoas pobres, se sentindo ameaçadas na sua existência pela negligência estatal, geralmente recorriam às defensorias públicas para garantir o fornecimento de remédios de alto custo ou mesmo para a realização de cirurgias, gerando uma judicialização sem precedentes nos serviços de saúde. Afirme-se, contudo, por culpa do próprio Estado que nunca cuidou da saúde como deveria fazê-lo. E mesmo após o advento da Constituição de 1988, onde a saúde tem primazia como direito fundamental, o tanto faz continua o mesmo.
Para resolver parte da questão, foi submetida ao Supremo Tribunal Federal a apreciação do problema da obrigatoriedade de fornecimento pelo Estado dos medicamentos de alto custo. Uma questão, aliás, cuja solução não precisaria de qualquer alta indagação: aos pacientes dos serviços públicos de saúde não pode ser negado o fornecimento de medicação, seja a qual custo for. Tudo simples de ser resolvido. Mas não. A retórica togada insiste em penalizar a população.
Tenho certeza que jamais houve uma formação tão contraditória, senão desrespeitosa, do que essa turma de agora no STF. Decisões estapafúrdias, invencionices jurídicas, votos e posicionamentos eivados de pessoalidades. E agora mais este absurdo: negar a Constituição no que respeita à obrigação do Estado perante a saúde da população em geral, e principalmente dos mais carentes.
Ora, a Carta Magna estabelece a saúde como direito fundamental do cidadão. Com efeito, o art. 196 reconhece a saúde como direito de todos e dever do Estado. Assim, todos devem ter direito à saúde, quer dizer, mecanismos de prevenção e de cura, atendimento médico, hospitais, postos de saúde, medicação aos necessitados, etc.
Mesmo que a atuação do Estado não seja abrangente perante todos, jamais deixará de sê-lo quanto se trata de pessoas carentes, pobres, necessitadas. Há de se reconhecer que só utiliza o sistema público de saúde quem realmente não tem outro jeito a dar. E com relação à aquisição de medicamentos, a carência em si não deve considerar o baixo poder econômico, mas sim a impossibilidade de sua aquisição pelo alto custo. E assim porque nem sempre a classe média tem condições de adquirir uma medicação específica e de alto valor.
Neste momento, quando a vida passa a correr risco pela falta de medicação, então é que o Estado deveria estar mais presente. Mas agora o STF quer dizer que não. E não porque quer impor uma série de exigências ante a urgência que cada caso requer. Antes de requerer o medicamento, o paciente ou sua família deve fazer uma série de provas verdadeiramente incompatíveis ante a situação.
Tem de provar que o SUS não tem o remédio, tem de provar que não tem recursos suficientes, tem de provar que fez os devidos requerimentos, tem de provar que a pessoa ou toma aquele medicamento ou corre risco de morte. Além de uma série de outras provas. Tudo complicação. E demasiada complicação. Num país onde a aquisição de um simples remédio se torna uma novela, que se imagine remédio controlado, de alto custo, tantas vezes importado.
No vão das inconsequências, que o STF decida: “A morte é um dever de todos e direito do Estado”.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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