Rangel Alves da
Costa*
Um fato
mais que inesperado ocorreu neste domingo, dia 04, no município sergipano de
Gararu, na região sertaneja do estado, quando uma chuva de granizo desabou no povoado
Lagoa de Dentro, numa região cuja seca já se estende por mais de ano. As
filmagens não deixam mentir.
Com
efeito, durante cerca de vinte minutos pedrinhas de gelo caíram juntamente com
os pingos grossos da chuvarada. Situação mais que inusitada, principalmente
ante o costume de se conviver com labaredas de sol escaldante sobre a pele,
logicamente que muitos temeram até pelo pior. Ou o mundo estava acabando ou a
fúria do tempo mostrava do que é capaz.
Outro fato
inesperado aconteceu na última segunda-feira na região oeste da Bahia, entre os
municípios de Luís Eduardo Magalhães e Barreiras, quando uma tempestade de
areia formou uma verdadeira barreira amarelada pouco antes do entardecer. Não
uma ventania forte ou um vendaval de repente surgido, mas uma imensa cortina de
poeira e pó que se fazia imaginar estar diante de uma verdadeira tempestade de
areia saariana.
Mais uma
vez o temor tomou conta de todos aqueles que passavam pelo local e presenciaram
aquilo que mais parecia uma praga contra faraó. A região nordestina está
acostumada a redemoinhos - e de todos os tipos -, mas não a manifestações
arenosas iguais aquela, varrendo tudo. Só mesmo na televisão se observa aqueles
malucos atrás de furacões, tempestades e demais demonstrações furiosas da
natureza, porém ali pareceu mesmo coisa do outro mundo.
No
município de Canindé do São Francisco, no Alto Sertão Sergipano do São
Francisco, um dos mais castigados pelas estiagens, no último dia 04 um raio
atingiu a antena retransmissora da Rádio Amanhecer FM e a estação teve que
paralisar suas atividades. Já noutra região da Bahia, a força de um raio acabou
matando nada menos que quinze reses numa propriedade.
Os raios,
porque geralmente antecedem as tempestades, as trovoadas e outras fortes
chuvaradas, são fenômenos raros pelos céus nordestinos, principalmente na
região mais semiárida do sertão. Com as secas frequentes e a escassez de nuvens
carregadas, somente quando os acúmulos lá em cima se tornam insustentáveis é
que os raios e os trovões irrompem para anunciar a boa nova do sertanejo. Mas
este nunca espera que raios possam fazer a parte mais destrutiva das
chuvaradas. E de repente acontece, derrubando árvores, destruindo antenas e
matando pessoas e animais.
Mas como
dizia o velho Pascácio, a coisa no sertão é tão feia que nenhuma boniteza chega
que não cobre além da medida. Para uma ideia de tal assertiva, as trovoadas tão
desejadas e esperadas acabam provocando um sofrimento terrível aos animais
fraquejados pelas duradouras estiagens. O gado está tão magro e tão fraco, no
verdadeiro couro e osso, que sequer suporta a chuvarada por cima. E também não
encontra forças para caminhar sobre a terra molhada, pesada, lamacenta, e então
desaba. Ou o sertanejo acorre em socorro ou ali mesmo se tornará comida de
urubus e outras aves carnicentas.
O que o
homem nordestino sempre espera é que o tempo não o considere como inimigo. Quer
dizer, sempre deseja não ser tão castigado pelas secas de ano a ano, não ter
seu roçado transformado em deserto, não ter de suportar tanto sofrimento de seu
pequeno rebanho e poder plantar e colher o alimento da sobrevivência. Significa
algo muito simples: uma normalidade climática como ocorre nas demais regiões,
onde as chuvas demoram mas sempre caem.
Contudo, o
que sempre encontra como resposta é a estiagem maior a cada ano, e ano após
ano. E quando as chuvas chegam vêm trazendo o inesperado lá de cima: granizo,
raios, pingos desmedidos e outras situações imprevistas. Mas o sertanejo
deveria se atentar para um fato: a sua região está totalmente devastada pela
ação do próprio homem. A vegetação nativa praticamente foi dizimada, não há
mais mata fechada, tudo foi devorado pela coivara, pelo facão e pelo trator. E
a consequência disso não poderia ser outra.
Uma das
consequências mais conhecidas é o aumento da temperatura. O calor insuportável
da região não é apenas fruto das predisposições do El Niño, mas da terra nua
que se chama sertão. Sem sombreado, sem arvoredo, sem planta que oxigene os
espaços, quando o sol cai vai logo espalhando sua língua de fogo sobre tudo. E
do jeito que vai, com a desenfreada destruição dos recursos naturais
sertanejos, muito mais acontecerá. E granizo parecerá picolé.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário