Rangel Alves da
Costa*
A cidade
grande já se mostra estranha demais, mesmo nela já tendo vivido desde muito
tempo. A capital sergipana, mesmo ainda considerada pacata, já não me atrai
como antigamente. Tornei-me quase como um estranho.
Consequência
disso é a minha ausência em muitos aspectos de sua vida. É como se a cidade
fosse um mundo diferente depois da porta da frente, e da porta pra dentro um
distanciamento sem fim. E sempre prefiro estar no retraimento solitário dentro
das quatro paredes.
Talvez eu
esteja errado por considerar como distância aquilo que não conheço o percurso.
Talvez eu esteja errado por resolver me afastar daquilo que costumeiramente nunca
me aproximei. Assim, o mundo lá fora pode não ser aquilo que imagino.
Na verdade,
sempre há um motivo para atrair. Tudo depende dos gostos, das predisposições,
daquilo que se deseja encontrar. Há a noite para quem gosta da curtição, há
diversas praias para quem gosta de banho de sol e de mar, há barzinho para quem
gosta de bate-papo casual, há museus para quem gosta de reencontro com o
passado, há diversas opções para quem gosta de arte, de folclore, de história.
Não
significa que eu não goste de tais ambientações e suas possibilidades. Sou
sempre adepto de tudo que diga respeito a manifestações culturais, a história,
ao conhecimento útil. O que implica mesmo é o distanciamento dessa realidade, é
a ausência onde tais aspectos se manifestam.
Possuo uma
visão diferente do conhecimento da cidade. Entendo que visitas pontuais a
museus, centros culturais e outros locais onde se manifestam as tradições
populares (artesanato, dança, comida típica, música regional), não são
suficientes para o enriquecimento cultural perante o que a cidade apresenta.
Creio
existir outras formas importantes de compreender não só a cidade como sua
história e suas feições sociológicas e culturais. Aprendi que olhar para o
alto, acima dos andares térreos dos edifícios e construções antigas,
possibilita encontrar, através das formas arquitetônicas, aspectos primordiais
da história de sua história.
Igualmente
aprendi que numa mesma fachada há dois momentos que devem ser compreendidos. No
centro da cidade, a parte térrea sempre apresenta uma feição diferenciada
daquela avistada mais acima. O que está embaixo, na linha da rua, apresenta a
feição comercial urbana, com fachada descartável e bem diferente da estrutura
do prédio em si.
Olhando um
pouco mais acima será possível avistar uma arquitetura antiga, imponente, com
linhas não mais utilizadas nas modernas construções. Desse modo, se abaixo há a
representação da cidade moderna, acima há a representação da cidade histórica,
de como ela foi evoluindo através de suas construções.
Por toda a
cidade existem detalhes impressionantes. A maioria das construções antigas,
principalmente nas residências senhoriais, palacetes e casarões, contém a data
de sua construção inserida na própria arquitetura. Poucos são aqueles que
observam e cotejam as datas com os marcos históricos. E também poucos os que
procuram saber sobre a história das grandes edificações, sua serventia no
passado e sua atual propriedade.
Também as
ruas contam muito sobre a história da cidade. E neste aspecto ganha relevo a
sociologia urbana. Em Aracaju, principalmente nos bairros que ficam no entorno
de onde nasceu a cidade, o tradicionalismo das ruas ainda continua preservado
em muitos aspectos. As fachadas antigas, bem adornadas, ainda estão presentes
em bairros como o Industrial e o Santo Antônio.
Muitas
dessas casas ainda possuem quintais, árvores e pomares, e também moradores que
gostam de sentar nas suas calçadas. Significa dizer que são moradias e
moradores que não perderam as feições passadas, que ainda preservam um jeito de
ser e viver ao modo interiorano, no relacionamento com a vizinhança e na
valorização de sua rua.
Desse
modo, atualmente, nas poucas vezes que caminho pela cidade é objetivando
observar seus pequenos detalhes, as pessoas que correm de lado a outro, o que
se manifesta pelos mercados centrais, o antigo e o novo comércio, onde ainda
está o velho e onde a modernidade se impõe. E, observando, compreender seu
percurso.
Mas, como
dito, apenas raramente saio por aí olhando para o alto, observando os pequenos
detalhes por onde passo. O antigo é muito mais fácil de ser reencontrado que o
novo. O moderno surge e já evapora. Por isso que vou atrás do passado.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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