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quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

O BOICOTE AO OSCAR E A QUESTÃO DAS COTAS


Rangel Alves da Costa*


Vejo como verdadeiro absurdo esse propalado boicote ao Oscar 2016. Tal recusa pelo fato de que atores negros não foram indicados às premiações. Opino que deveriam procurar o que fazer tanto Spike Lee como os demais que estão à frente do ato de insurreição.
Contudo, antes de expor outras motivações, urge fazer algumas considerações acerca do tratamento diferenciado que hoje se propaga pela cor, orientação sexual e outras categoriais sociais.
Por mais que possa ser criticado, entendo que a busca pela igualdade, principalmente de oportunidade, através de cotas e outros privilégios, acaba acentuando ainda mais o sentimento de inferioridade, de preconceito e de discriminação.
A maioria das constituições modernas possui no princípio da igualdade um dos preceitos fundamentais. Significa dizer que há o reconhecimento jurídico da não diferenciação, da proibição de tratamento desigual por sexo, cor, religião, opção sexual, e muito mais.
Aquelas classes sociais que a lei procurou inserir igualitariamente, já estavam, por luta e esforço próprio, emancipadas e exemplificando o que de melhor possa existir no ser humano: a luta em condições de igualdade pela sobrevivência e o reconhecimento profissional pelo empenho.
Quando já parecia assentada a ideia da igualdade constitucional, no amplo sentido, eis que determinados grupos sociais, aqueles mesmos que no passado reclamavam de preconceito e discriminação, se insurgiram contra os novos tempos e gritaram: Não somos iguais, e por isso queremos mais direitos!
Que dizer, foram determinadas categorias sociais que reacenderam contra si o preconceito e a discriminação, através de igual preconceito e discriminação, vez que começaram a se comportar como se excluídos fossem da sociedade, do estudo e do mercado de trabalho. E também abominando outras classes sociais.
Depois que o elemento cor da pele já não tinha importância alguma para a grande maioria do povo, eis que alguns negros novamente se sentiram como escravizados, açoitados pela sociedade, e com isto se sublevaram através de autodiscriminação e vitimização. Se há exigência de um tributo histórico, sua cobrança não deve ser feita assim. Mas pela demonstração de capacidades.
Patente é a autodiscriminação. Esta porque muitos grupos em defesa dos negros surgiram como se estes continuassem nas senzalas, nos troncos, no banzo dos tempos. Forjaram realidades, inverteram o preconceito e procuraram se abrigar nos cabides das políticas sociais e das novas leis surgidas para proporcionar tratamento desigual em função da cor.
O pior é que foi, no caso brasileiro, o próprio governo federal o gerenciador maior das políticas preconceituosas do tratamento diferenciado e discriminado, como se no país houvesse uma classe de “pessoas” e outra classe de “outras pessoas”.
Neste contexto é que surgiram as chamadas políticas de cotas. Daí que as leis determinam tratamento diferenciado no acesso ao ensino, nos concursos públicos e outros setores da vida. Tais políticas, por mais bem intencionadas que sejam, não deixam de desigualar os cidadãos e impingir-lhes um sentido de inferioridade.
Muitos daqueles que se ajustam às cotas, simplesmente abominam essa ideia de serem vistos como inferiorizados ou menos capacitados que os demais. E há de se perguntar: Já foi comprovado cientificamente que a cor diferencia o sujeito no ser, no saber, no fazer? Não tenho conhecimento de sua existência.
E vejam esta notícia: Projeto em tramitação no Senado Federal, já aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça, estabelece cota de 15% das vagas dos concursos públicos federais para homossexuais e transexuais. Bissexuais continuam na luta pelo benefício mas ainda não foram contemplados no texto base do projeto.
A tudo isso se pode denominar subversão da ordem. E uma subversão de tal ordem que mais adiante a sociedade estará partilhada em cotas. E cotas para os maridos traídos, para os solitários da vida, para os ébrios e errantes, para o ex-condenado: 15% de vagas para quem cumpriu pena por crime hediondo. A sociedade não funciona assim.
Mas voltando ao Oscar, a revolta de Spike Lee e outros não tem nenhum sentido. A Academia premia pela competência na atuação, mesmo que muito lobby seja feito em torno de alguns nomes. Mas nada justifica que a cada premiação atores negros tenham que estar disputando a estatueta.
O boicote deveria ser direcionado aos estúdios, aos produtores e aos diretores, mas não à Academia. Deveriam exigir mais papéis para os negros e assim possibilitar mais ascensão e possibilidades de premiação. Será que os indicados não mereceram tal reconhecimento?
Com tal atitude, infelizmente se corre o risco de a premiação do Oscar perder sua importância. Acaso o sistema de cotas seja futuramente aplicado, todo mundo vai dizer que tal ator negro só foi agraciado pela cor. E será um remédio surtindo efeito contrário.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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