*Rangel Alves da Costa
Ou o homem conta a sua História, ou a
história do homem será levada pelas ventanias do esquecimento. No contexto de
tal enunciado é que se insere o sertanejo e poço-redondense Manoel Belarmino.
Este descendente dos Soares, de ancestralidade vinda desde o Território de
Maria do Rosário e arredores, chamou para si a difícil, porém prazerosa,
incumbência de contar a história do povo sertanejo ao próprio sertanejo.
Daí a importância de Manoel Belarmino para o
conhecimento de Poço Redondo e do sertão. Ampliando tal entendimento, pode-se
afirmar que dos seus escritos - seja em forma de texto ou de cordel, seja
através de palestras ou de curtos proseados - tem-se por revelado o sertão em
amplitude, envolvendo a formação da raça sertaneja, os seus aspectos históricos,
o ressurgimento de personagens tão importantes mas que restaram no esquecimento
de grande parte da população.
Certamente que muitos não gostam de seus
escritos. E assim acontece por que Belarmino não cala ante o que deva ser dito,
não se faz de cego ante o que precisa ser visto, não negligencia ou omite seu
senso de cidadão, de homem politizado e porta-voz de muitos que falam pelos
seus escritos. Belarmino é assim: querido ou odiado, mas necessário. E tão
necessário que muito do sertão, da realidade social e da realidade quilombola,
não seria conhecido sem o que ele traz aos olhos de todos.
Belarmino não precisaria de formações e mais
formações acadêmicas, doutoramentos e títulos e honrarias, para se mostrar
sábio naquilo que se envolve e faz. Grande parte de seu estudo e de seu
conhecimento nasce da realidade social na qual adentra de coração. Num instante
está na Serra da Guia, no outro já está na Rua dos Negros, e ainda no outro já
pode ser avistado em reuniões e proseados com comunidades distantes. Belarmino
gosta do diálogo, de conhecer raízes, de se aprofundar nos percursos
históricos, de buscar a palavra naquele que ninguém acredita sequer ter voz.
Seu ativismo político e ideológico produz
insatisfações. Mas não seria de se esperar diferente. Ora, Belarmino não é
diferente dos demais cidadãos. É homem comum, simples, humilde. O que o
diferencia, contudo, é um poder de percepção (talvez) maior da realidade
social. E tal percepção logo se transforma em palavra, em escrito, em alerta ou
mesmo grito desaforado. Nunca soube avistar, sentir, amargar nas entranhas e
doer sobre a pele (não só dele como das desvalidas comunidades) e simplesmente
calar, engolir, deixar pra lá. Não é, pois, do seu feito, negligenciar. E tudo
diz, e tudo mostra, ao seu modo.
Por outro lado, depois de Alcino Alves Costa,
talvez não tenha quem tenha cavoucado mais as entranhas da história de Poço
Redondo e do sertão do que Manoel Belarmino. Não só os fatos, as raízes, os
surgimentos, as entranhas da história de um povo, mas também os seus mitos,
suas lendas e tradições. Neste sentido, o que Belarmino faz é ser cultura, ser
história, ser sociologia, ser antropologia, ser geografia e muito mais. De
repente, e lê-se um texto seu sobre o Poço Redondo antigo, sobre seus antigos
folguedos, sobre personagens agora esquecidos como Augustinho.
Outro dia, ao lado de Ana Bela de Juvenal e
Quitéria Gomes de Bonsucesso - pois estes os de Poço Redondo -, Belarmino foi
empossado como membro da Academia Sergipana de Cordel. Uma honraria,
certamente, um orgulho bom ao mundo sertanejo. Mas isto não é o que lhe causa
maior prazer. Seu maior prazer é estar debaixo de um sombreado de pé de pau
reunido com pessoas do campo. Seu maior prazer é estar compartilhando com Dona
Zefa da Guia as sabedorias do mundo. Seu maior prazer é escrever sobre todo o
seu aprendizado em cada situação assim.
Parabéns, Belarmino. O seu amor pela história
de Zé de Julião nunca será em vão. O seu amor pela história e pelas lições de
Alcino nunca serão em vão. O seu amor pelos negros, pelos quilombolas, pelos
desvalidos, nunca será em vão. Nada será em vão se há compartilhamento do que
se viveu e aprendeu na estrada. E isso você faz muito bem. E Poço Redondo e o
sertão agradecem.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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