*Rangel Alves da Costa
O ciclo da vida e de tanta coisa: rochedo,
pedra, grão, pó... Ou simplesmente da pedra ao pó e as lições do tempo. Assim
também a subida no ponto mais alto da escada e a abrupta queda, a postura
arrogante e a submissão como revide do destino, o poder e a riqueza e o
posterior fraquejamento na desvalia. Nada será sempre tão rochedo que mais
tarde não se transforme em pó. E quanto maior a soberba maior será a
deterioração.
A História exemplifica bem a
indestrutibilidade que acaba se esfacelando. Grandes e poderosos reinos,
impérios e civilizações, acabaram se dobrando às próprias fraquezas que se
mantinham ocultas. Castelos imponentes, fortalezas abastadas, palácios
suntuosos, governantes absolutos, porém tudo afeiçoados a grãos de areia. O
ferro que enferruja, a rocha que sucumbe ao vento, o indestrutível que se
esfacela até em pó se transformar.
Grandes e invencíveis conquistadores acabaram
sendo dizimados por uma seta qualquer, uma doença, um surto. Sobre os escudos
impenetráveis, eis que uma ponta afiada alcança a mortal passagem. Alexandre, o
maior dos conquistadores, ainda jovem pereceu por uma moléstia adquirida nos
campos de batalha. E talvez tenha se perguntado no leito de morte: Qual a valia
de tanta conquista, de submissão a tantos povos, se não pude vencer a batalha
que está em mim?
Genghis Khan, o temível e terrível conquistador
mongol, submeteu quase o mundo inteiro. E depois morreu acometido por uma
febre. Átila, rei dos hunos e cujas sombras amedrontavam os maiores
imperadores, venceu as mais difíceis, contudo não conseguiu vencer uma
hemorragia no seu próprio castelo, morrendo ensanguentado em si mesmo. Golias,
o guerreiro bíblico, imenso e poderoso, sucumbiu ante o pequenino Davi. Dizem
que morreu atingido por uma pedra.
E o que dizer do poderoso império romano,
desbravando e conquistando quase todos os povos de então, mas que foi
esfacelado pela falsa ideia de superioridade indestrutível? Ora, na ânsia
conquistadora, subjugou e tributou, feriu e escravizou, todo e qualquer povo
encontrado pelos seus generais. Contudo, esvaziado na própria sede, foi sendo
acossado e submetido por aqueles mesmos desconhecidos que foram submetidos ao
seu poder. Então os bárbaros fizeram sucumbir o presunçoso e arrogante império
romano.
São apenas exemplos de como os castelos de
areia sempre estiveram presentes em toda época e por todo lugar, desde os
reinados poderosos aos mais temidos conquistadores. Assim, de repente, o que
parecia indestrutível tombou pela força de um vento oculto chamado tempo. E
este, o tempo, soprado pelas lições de um livro em cujas páginas diz que toda
arrogância se destrói por si mesma, todo mando será desobedecido, tudo que se
mostra de uma forma amanhã já estará revelado na sua antítese.
O ferro, esse metal duro, imperecível, símbolo
de força e durabilidade, não consegue conter o avanço do tempo. Suporta tudo,
menos a força do tempo. Não só a voracidade do tempo como a acidez da maresia.
Com o passar dos anos, a cor férrea vai se tingindo com um matiz diferente,
entre o marrom e o afogueado, para logo surgir a face voraz da ferrugem. Como
uma doença que vai destruindo as células, assim a ferrugem vai se alimentando
do ferro até devorá-lo completamente.
A fortaleza vai se corroendo pelo correr dos
anos e o seu fim restará em escombros. A madeira rija nunca se mostra tão
impenetrável que mais tarde não se transforme em moradia e caminho de cupins.
Pequenos insetos vão se assenhoreando de imensas e centenárias árvores, lentamente
roendo seus troncos, até que desabem sem vida. Tudo definha com o tempo, tudo
morre com os anos, tudo se mostra incapaz de vencer o destino. Ora, já dizia
Eclesiastes que tudo começa e acaba, tudo nasce para morrer, num ciclo
constante e inevitável.
Não se pode fugir de sua leitura: Tudo tem o
seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há
tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que
se plantou. Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de
edificar. Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de
dançar. Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar,
e tempo de afastar-se de abraçar. Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de
guardar, e tempo de lançar fora. Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar
calado, e tempo de falar. Tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e
tempo de paz. Assim no Eclesiastes (3:1-8), assim na vida.
Contudo, mesmo com as lições e os exemplos do
tempo, nunca há garantia que o homem se reconheça na sua fragilidade. Por mais
que saiba que a vida é feita de causas e consequências, por mais que reconheça
ter a existência a força de uma onde que se desmancha na areia, ainda assim prefere
o ímpeto à humildade, prefere a arrogância à modéstia. Não sabendo que o vento
sopra e que o seu castelo é de areia.
Escritor
Membro da Academia de Letras de Aracaju
blograngel-sertao.blogspot.com
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