*Rangel Alves da Costa
POÇO
REDONDO, SERTÃO SERGIPANO DO SÃO FRANCISCO, SITUADO NO POLÍGONO DAS SECAS, NA
REGIÃO SEMIÁRIDA DO NORDESTE, CARACTERIZADO PELA VEGETAÇÃO ARBUSTIVA NORDESTINA,
COM PREDOMINÂNCIA DE CACTÁCEAS. AS ESTIAGENS, COM SECAS PROLONGADAS, PERDURAM
POR ANOS SEGUIDOS.
Estrada de
asfalto nas rodovias e principais áreas de acesso. Estrada de chão poeirento e
espinhento nos demais interiores e ao redor das povoações. Veredas que se alongam
em meio ao que restou da mataria. Mas tudo como um campo aberto pelo
desmatamento e morte das plantas pela ausência de chuvas.
O sol
começa a afoguear já nas primeiras horas do dia. As noites já não são tão
refrescantes como noutros tempos. Ao aproximar-se o meio-dia então tudo se
transforma em fornalha. No céu sem nuvens, apenas o clarão que desce em
quentura e desolação. De canto a outro e nunca se avista uma formação chuvosa.
Casebres e
casinholas de beira de estrada e mais adentro, tudo parece abandonado. Casa
fechadas ou de porta batendo sem aparecer vivalma. Mas os moradores continuam
nos mesmos lugares onde estiveram, só que agora sem o ânimo para aparecer na
janela ou caminhar fazendo uma coisa e outra pelos arredores ou na malhada.
São
poucos, mas ainda são avistados os bichos próprios desse sertão. Ali e acolá
andeja uma vaquinha magra, ossuda, tropeçando no próprio passo. Mais adiante um
cachorro magro deitado a pouca sombra de um umbuzeiro. Jegue, cavalo, burro,
tudo num só sofrimento pela falta do pão da terra e da fonte. Não há mais água
e nem capim.
Comer o
que? O que o bicho vai comer ou beber? Eis o santo sacrifício de tudo. Menino
passa fome, mulher passa fome, velho passa fome, mas com o bicho é diferente.
Assim diz o sertanejo. E por isso seu sofrimento quando já não há palma, não há
resto de folha, não há qualquer broto no chão.
Da porta
adentro uma tristeza só. Nada sobre o fogão de lenha. Num canto uma menina
bonita brincando com uma velha boneca sem braços. Noutro canto um menino bonito
brincando com ponta de vaca. Mas como conseguem brincar e até sorrir diante uma
situação dessas?
Passa um
calango correndo. Tem que correr para não acabar assado no fogo de chão. Não há
caça nem fruta do mato. Desde muito que o preá deixou de correr pelos arredores
e não há mais codorna ou nambu. A mata sertaneja já não existe. E onde não
existe mata não pode existir caça, passarinho, avoante ou qualquer ser que faça
ninho ou pouse no pé de pau.
Ante a
seca devastadora, já não se consegue avistar plantas nativas nem aquelas que suportam
as estiagens mais prolongadas. As catingueiras são magras, definhadas,
acinzentadas e desnudas.
As
cactáceas como o mandacaru, o xiquexique, a palma, o facheiro e a jurubeba,
mesmo sendo adaptadas aos climas mais áridos e secos, já não suportam a força
do sol e a queimação do calor. Igualmente a demais vegetação, também vão
morrendo aos poucos.
Mas o
sertanejo é o mesmo. E continua mais forte. Não haveria que se pensar diferente
quando o sofrimento é tão grande e devastador e ele continua adiante da porta,
no meio do tempo e debaixo do sol, tentando avistar nuvem de chuva, sonhando
com pingo d’água, fazendo planos para o futuro.
Mas em
Poço Redondo já são quatro anos de seca. Oito dias sem um pingo d’água na
torneira. E agora sem água mineral pra vender. Só restam as bolhas de suor da
luta. E quando acabar o suor?
Escritor
Membro da Academia de Letras
de Aracaju
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário