POEMA TRISTE
Rangel Alves da Costa*
Pensei em escrever um poema triste porque eu estava mais triste do que qualquer poema triste. Depois que escrevi o poema triste, vi que o poema ficou muito triste e eu fiquei mais triste ainda com o poema triste.
Tudo começou porque dei um sorriso depois de mais de cem anos. O último sorriso que havia dado, ainda me lembro como se fosse hoje, foi quando descobriram que o orvalho não era a lágrima da planta. Eu já sabia disso porque nunca fui manhã, mas sempre lágrima.
Essa tristeza toda que existe por aí não existia em mim. Tanto fazia a chuva caindo por detrás da vidraça, o entardecer tristemente avermelhado nas montanhas, o som dos pingos na telha em noites de solidão, a música bonita e marcante de um dia, o vento leve que parece trazer saudades, as tardes com os seus encantos e as noites com os seus encantamentos. Nada disso me fazia entristecer ou ficar mais triste.
Outras coisas me deixavam realmente mais triste, e digo porque não tenho medo de entristecer novamente: a chuva caindo por detrás da vidraça, o entardecer tristemente avermelhado nas montanhas, o som dos pingos na telha em noites de solidão, a música bonita e marcante de um dia, o vento leve que parece trazer saudades, as tardes com os seus encantos e as noites com os seus encantamentos. Achou estranho porque repeti aquilo que acima havia dito que não me fazia entristecer?
Ocorre que a tristeza independe do querer ou desejo. E porque sou triste não adianta nas manhãs unir as mãos numa prece implorando para que tenha um dia pleno de alegrias e felicidades. Terei sim felicidades e alegrias, mas feliz por estar triste sem sofrimento, triste sem amargura e desilusão, triste sem a tristeza da dor mortal. Apenas triste, com a tristeza dos poetas tristes.
E digo o mesmo com relação às alegrias, pois estarei alegre por estar calmamente triste, alegre por estar inspirado na tristeza e alegre porque sei que não há alegria e que tudo não passa de uma ilusão chamada momento. Todo mundo se ilude com o momento e depois vive dizendo que perdeu tempo na vida.
Também não importa que as pessoas me critiquem por sempre me encontrarem com jeito, cara e modos de tristeza. Já disse que alegria não existe, que toda alegria é falsa, que os verdadeiros choram sua dor chorando e não fingindo alegria. Sabe o que é a verdadeira alegria? Somente a vida, somente o viver é a verdadeira alegria.
E não adianta criticar porque o meu semblante se nega sempre a sorrir só porque alguém acha que o sorriso é alguma coisa. Ledo engano, pois o prazo de validade de um sorriso dura o mesmo instante da falsidade. De que adianta sorrir se um gesto na boca está escondendo vendavais e tempestades no interior, lá no íntimo, onde a triste mora e faz questão de ser eterna?
Mas é melhor não dar mais explicações sobre a minha tristeza e voltar ao que dizia com relação ao poema. Disse que escrevi um poema triste e fiquei mais triste que o poema, foi isso. E o poema nem era tão triste assim, pois falava em infância, em desejo, em namoro, em você. Falava em você.
Então foi isso, escrevi um poema triste e fiquei mais triste que o poema por causa de você. O poema falava em você... Fiquei mais triste porque fiquei com saudade, e o poema falava em você...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
"As coisas findas, muito mais que lindas, essas ficarão." (disia Drummond). Eu encaro assim a alegria. A tristeza já é parte intrínseca de nós, creio, por causa de tanto que tentamos negar a existência. Então , dos momentos de alegria procuro afirmar-lhes uma perenidade pra ver se me mantenho assim sempre que possível. Sua crônica se transformou num belo poema, isso sim! Abraços. Paz e bem.
Postar um comentário