SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 18 de setembro de 2010

PRAZER EM RECEBÊ-LO, AMIGO! (Crônica)

PRAZER EM RECEBÊ-LO, AMIGO!

Rangel Alves da Costa*


Ontem um amigo percebeu que eu estava triste, meio chateado com algumas dessas situações que surgem como o sal necessário no tempero da vida. Estava não, amigo, ainda estou; ou melhor, tenho andado muito triste com esse mundo novo que não nos oferece nada de bom.
Algumas constatações infelizmente são tristes, amigo. Cansei de me perguntar, e por isso mesmo agora lhe passo a pergunta: Vivemos o novo, o moderno, mas onde estará a modernidade? Éramos tão ruins, bestiais, ignorantes, deseducados e desumanos no passado que agora somos civilizados? Onde está a civilização desse homem da modernidade, cada vez mais cruel e inimigo de si próprio e do próximo? Esqueceram de inventar a tecnologia do amor, da compreensão, da amizade, vez que a pedra lascada no coração do homem continua somente sabendo saber ferir?
E pergunto mais, amigo: Por que, amigo, o mundo se aproxima, se aglomera mais, tudo é tão próximo e ladeado, e o homem é cada vez mais distante, mais irracional, mais ignorante, mais bicho do que gente? Diante de tantas lições surgidas, de inventos revolucionários, de descobertas mirabolantes e dos remédios e meios para se curar quase tudo, por que não inventaram um homem cuja honestidade e humanismo seria exemplo para os outros homens? Por que amigo, marte virá, a vacina virá, tudo virá e o homem de repente some? Ou será que alguém pensa que são pessoas esses seres que se olham com olhos de ódio e com um punhal guardado no coração?
Amigo, nada disso é fácil interrogar. Às vezes penso em minha ilha, no meu quarto, na minha montanha, embaixo da minha cama, num subterrâneo qualquer, qualquer lugar que eu possa ser feliz sem precisar cruzar com certas pessoas, viver com certas pessoas, conviver com certas pessoas. O que dói é não ser falso, é realmente sofrer com isso tudo de ruim que há na vida. Seria muito bom nem se incomodar com nada, com a ruindade ou a falsidade das pessoas, mas é difícil demais ser mais um.
Qualquer dia vou viver de novo. Prometo. Qualquer dia a vida me deixará reencontrá-la e aceitar meu perdão. Por que cidade, por que cimento, por que essa ilusão desumana? Fui besta demais. Mas qualquer dia vou viver de novo. Qualquer dia arrumo meu alforje, pego meu gibão e meu chapéu de couro, coloco meus tarecos num bornal e vou lá para o alto da montanha, para o casebre encantado, para o encontro com a natureza, para conversar com Deus e com os bichos, para tagarelar comigo mesmo, prosear com o vento e assobiar pra passarinho. Você será convidado a chegar por lá, amigo. Será um prazer em recebê-lo na minha maior grandeza e felicidade.
Veja como é a vida, amigo. Você vai beber água de moringa dormida no sereno da noite; vai comer nambu assada com feijão verde novinho; vai tomar café batido ao entardecer no pilão; vai ouvir notícia e música da boa no radinho de pilha; vai se iluminar com candeeiro, lampião e vela; vai beber pinga da boa, do engenho, misturada com casca de pau de umburana, aroeira e angico; vai alegrar e corpo e espantar o cansaço tomando banho no córrego, nas águas da cachoeirinha que desce montanha abaixo.
E vai mais, amigo. Vai se proteger do resfriado, do defluxo e das dores que possam surgir pelo corpo com os remédios plantados no quintal; vai chorar como um homem que se reconhece na felicidade, ao ver o por do sol mais lindo do mundo, o galo cantar no alvorecer matuto, ao ver revoada e ninhos de passarinhos ao alcance de sua mão e em todo lugar, ao ver andar e correr pela natureza virgem, ao sentir brisa e vento soprando e não trazendo nenhuma saudade da cidade grande. E nós vamos prosear, amigo. Vou lhe contar o causo da rapariga virgem, do menino que avoava, da vizinha que chocalhava o rabo quando estava no muro falando da vida dos outros. E tem ainda aquela do passarinho. Mas essa é triste demais. Quem dera poder voar o bichinho...
Quando voltar, amigo, se quiser pode contar aos outros o que é mundo e o que é viver. E diga a eles que podem se preocupar comigo que certamente estarei muito preocupado com eles.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Um comentário:

Toninho disse...

Ler suas cronicas é como se encantar pelas letras que se harmonizam para dar vida em cada expressão, como se fosse magica.São leves pela maneira simples e facil que voce tem, devido ao dominio da lingua e dos costumes.Sua tristeza, sua angustia, que pode parecer como a de muitos de nós que sonhamos com uma vida mais amena, menos selva, que busca um resgate da felicidade do tempo em que menino nada exigia e tudo vivia, pois tinha a liberdade e o mundo nos pés.Sonha e busque esta felicidade de estar num cantinho onde nao aja falsidade,maldade nem lei que nos diga como ser feliz dentro de paramnetros. Sempre bom estar aqui. Meu abraço e vamos proseando por ai.