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domingo, 20 de novembro de 2016

OLHAI OS LÍRIOS DO CAMPO (POIS OUTRA RIQUEZA NÃO VALE NADA)


*Rangel Alves da Costa


Não são vãos os ensinamentos. Num ramo de flor um livro aberto. Na singela relva que se embala ao frescor do vento uma lição ao olhar. Tomai como exemplo os lírios, aqueles sublimes lírios que brotam adiante. Então olhai os lírios do campo!
Eles estão ao alcance do teu olhar. E estão por todo lugar. Olhai, então, os lírios do campo! Não há jardim mais suntuoso que se imponha com maior beleza. Não há brilho e aroma que sejam mais edificantes que a simples visão dos lírios do campo.
Mas se agora, após a porta ou a janela, não se possa avistar qualquer lírio, muito menos uma colcha de lírios que se estenda formosa pelos campos, então onde encontrá-lo? No teu olhar que prefere avistar a vida com simplicidade e não pelo que se mostra imponente adiante.
Sábio é o olhar que procura a essência, não a aparência, já disse o profeta. Verdadeiro é o olhar que encontra a beleza onde outros olhos só avistam a feição que possa ser desprezada, já disse o caminhante da cruz. Sábio é o teu olho que não enxerga apenas os lírios do campo, mas o significado dos lírios do campo.
Qual o significado dos lírios do campo? Leia no Livro Sagrado, em Mateus e Lucas, no sermão da Montanha: Olhai como crescem os lírios do campo: eles nem trabalham nem fiam, contudo vos digo que nem Salomão em toda sua glória se vestiu como um deles.
Extrai-se das sagradas palavras um avistar de simplicidade, humildade e modéstia que deve pairar sobre tudo. Um olhar que valorize as coisas simples, que tenha o dom do encantamento com as pequenas ternuras, que vá além da flor e sua pétala para buscar a grandiosa essência em cada pólen.
Extrai-se da sagrada lição que aos olhos bons não adianta o revestimento da fortuna ou da suntuosidade. Basta, aos olhos bons, que o avistado faça bem, faça sorrir, traga alegria ao próprio olhar. É como se o olhar buscasse o contentamento e não a ojeriza.
Extrai-se do ensinamento o valor das pequenas coisas, a grandeza das pequenas coisas. Ora, mais vale o silêncio a algazarra, mais vale a pequena fonte que o oceano inalcançável, mais vale o pão que a mesa, mais vale o abraço de permanência que a posse e o adeus.
Olhai, então olhai os lírios dos campos! Os pés que passam descalços não são menos pés que aqueles calçados em couro importado. As mãos enrugadas que se estendem para o cumprimento não são menos dignas que aquelas que chegam ornadas de anéis e honrarias.
E não somente isso. Os pés que passam descalços se confortam com qualquer chão e qualquer calçado. As mãos enrugadas tocam sem medo de qualquer outra mão. E sapatos existem que não pisam em todo lugar. E mãos existem que se lavam depois de tocadas.
Vaidade das vaidades, tudo é vaidade. O Eclesiastes assim ensinou. Mais vale o que pode sonhar adormecendo em cima de pedra que aquele tomado de pesadelos em cima de travesseiro de pluma. Quantos compreendem o sentido da vida quando sequer conhecem o viver?
Vaidade das vaidades, tudo é vaidade. A lição do retorno como a maior lição. O sol também se põe para a lua aparecer. Depois da noite a manhã. Tudo é para depois já ser de outro modo. E por que se arvorar de vaidades? Quem está ao chão pouco sente a queda, mas quem vive ao alto sequer sabe cair. E quando cai...
Tudo isso acontece de modo diferente em quem sabe avistar os lírios do campo.  Quanta lição e quanta glória poder avistar os lírios do campo e de seu formoso manto também recobrir-se de vida nova, de canto novo. Lírios que perfumam a alma e colocam diante do olhar o verdadeiro sentimento de mundo.
Mas não é todo olhar nem qualquer um que encontra lírios pelos caminhos. Ora, quem se nega ao singelo também se nega a avistar aquilo que não seja de ouro ou prata. E nem ouro nem prata nos lírios do campo. Apenas a vida na sua mais profunda beleza.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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