*Rangel Alves da Costa
O amor já não é o mesmo. Desde muito que se
transformou em algo muito diferente de sua concepção original. Até não se ama
mais como raiz e flor, como se diz em reverência à pureza de verdadeiramente
amar. Mas o que houve com o amor?
Nada com o amor, mas tão somente com as
pessoas. São estas que retiram as ternuras e os encantamentos dos corações. E
poucos são os que ainda semeiam o amor afetivo, o terno relacionamento, a
comunhão prazerosa de espírito e alma.
Um amor assim tão sublime, pujante e real,
que torne o pensamento em oração, a união em fé, o encontro em dádiva, a
saudade em dolorosa aflição. Um amor que se eleve de tal forma que o enamorado flutue
entre anjos e passarinhos.
Mas o que fizeram do amor ou no que transformaram
o doce e tão sublime ato de amar? Uma imagem como resposta: uma janela aberta e
olhos ávidos à espera de alguém que vai chegar. E a mesma janela aberta para o
tanto faz da ventania.
Assim a diferença entre o amar e o fingir ou
nada sentir. Quando a janela aberta passa a nada mais significar, então será
porque os sentimentos se perderam em horizontes outros que nenhuma simbologia
afetiva possuem.
Amar não é o que comumente se tem como amor. Transformar
o corpo em chama de amor não é amar. Banalizar a relação em nome de amor não é
amar. Fazer da carne, do sexo e do prazer, um jogo de entrega e de dispensa,
jamais significou gesto de amor.
Na Bíblia, no primeiro Livro de Coríntios,
capítulo 13, a síntese de um amor real:
O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com
leviandade, não se ensoberbece. Não se porta com indecência, não busca os seus
interesses, não se irrita, não suspeita mal; não folga com a injustiça, mas
folga com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta...
Por outro lado, o amor entre pessoas não é
aquele de beijo sedento. O amor não abraça voraz. O amor não vive de sexo. O
amor não se deixa usar nem se lambuzar. O amor não é apenas um desejo
reciclável e reutilizável como a muitos possa parecer.
O amor não se desnuda por permissividade. O
amor não se mascara em sentimentos vãos. O amor não abre a boca de olhos
fechados. O amor não se esconde em ilusões e fantasias por ter vergonha de si
mesmo. O amor não aceita nada além do amor. O amor quer amar, verdadeiramente
amar.
O amor é muito diferente, pois, desse impuro
véu com que fora encoberto. Quem um dia soube ou ainda sabe amar, quem um dia
fez do seu encantamento um prazer de alma, infelizmente nada mais pode sentir
do que a completa desilusão.
Frente à realidade falsa e fingida, perante o
presente lascivo e imoral, diante de tudo e qualquer coisa que se chama paixão,
o que se tem é a mais completa desilusão do amor em quem sabe amar. E com
plenas razões para os desenganos e as decepções.
Não que deseje agora a mesma feição romântica
do passado. Não há mais serenatas à janela, não há mais flores deixadas no
umbral, não há mais declamações de poemas apaixonados, não há mais o coração
pulsante apenas pela recordação.
Não que se espere encontrar a cordialidade
amorosa de outros tempos. Não há mais bilhetinho deixado entre as folhas do
caderno, não há mais recados perguntando se quer namorar, não há mais flores
roubadas para o primeiro encontro. E nem aquele beijo tão leve e tão profundo
que parecia fazer voar.
Não há mais corações e setas desenhados em
troncos de árvores. Não há mais beijos soprados com o coração e arremessados na
distância. Não há mais o olho piscando, a boca sorrindo envergonhada, a pele se
ruborizando perante um encontro numa esquina qualquer. Não há mais nada disso
por que o amor é outro.
Transformaram o amor em desamor, como jarro
com flor de plástico no lugar do mais belo jardim. E tudo isso causa um
sofrimento terrível em quem não aceita sentimento tão nobre sendo transmudado
em algo volúvel, apenas aparente.
Contudo, mesmo entre desesperanças e
desilusões, há de continuar amando. Amando a vida, o lar, a família, os bons
amigos. E tudo como uma paixão do que ainda resta como mais sublime ao coração.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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