*Rangel Alves da
Costa
No Brasil,
difícil não reconhecer que a ação de alguns provoca impactos desastrosos
perante os demais. Por mais que a ação seja justificada por aqueles que a levam
a contento, ainda assim a grande maioria será prejudicada. Não raro que são
ações premeditadas para produzirem efeitos políticos ou ideológicos, sem que se
considerem as nefastas consequências para a comunidade que nada tem a ver com
quebras de braços ou brigas de poder.
Exemplos
disso podem ser observados nas greves por meros caprichos sindicais, no
fechamento de rodovias por grupos de assentados, no impedimento do
funcionamento de escolas por grupos de estudantes orientados por outros
interesses, nas manifestações que acabam impedindo o funcionamento dos órgãos
públicos. E o exemplo maior seria a escolha de governantes e legisladores. As
escolhas malfeitas de alguns nada mais servem que penalizar a sociedade como um
todo.
São as
escolhas feitas por alguns que produzem consequências gerais, de modo
prejudicial e até lesivo. Muitas vezes, a falta de conhecimento, a baixa
escolaridade, a carência de conscientização e de senso crítico, além da
permissividade como massa de manobra, transforma a ação de minorias num
perigoso jogo de interesses. E interesses estes que só dizem respeito mesmo a
alguns que ao longe ficam observando a concretização insidiosa de seus
objetivos. E verdadeiras tragédias surgem perante as ações impensadas de poucos,
porém orquestradas por espertalhões que ficam ao longe monitorando os
resultados.
Há uma teoria
popularizada pelo ecologista norte-americano Garrett James Hardin, mas esboçada
desde a filosofia antiga e aprimorada por recentes pesquisadores, denominada
Tragédia dos Comuns. Pode contextualizar diversas situações, mas principalmente
na afirmação de que pessoas comuns, quando passam a agir contra os interesses
maiores da comunidade da qual fazem parte, acabam prejudicando a si mesmas e ao
todo. Suas ações, que não podem ser dissociadas do contexto geral, por mínimas
que sejam, ainda assim possuem o efeito de um simples bater de asas: produzir
devastações inteiras.
O cerne da
questão envolve a ação contrária ao desejo e ao pensamento da comunidade. Uma
ação descontrolada de alguns sobre determinada questão terá como consequência o
prejuízo de todos. Fugindo-se da estabilidade, dos meios concebidos por todos
como os melhores, certamente haverá uma ruptura e uma desagregação daquilo
anteriormente pactuado. Ademais, os interesses pessoais, quando exercidos de
modo impensado ou mesmo egoísta, provocam não só a divisão de interesses como
fragilizam o interesse geral, dado o esfacelamento do bem comum.
Há algum modo
de se evitar tais tragédias, vez que somente observáveis quando os prejuízos já
foram causados? Difícil, mas não impossível. Considerando que o aprendizado
tantas vezes surge somente quando a lição é dolorosa, espera-se que as
consequências sejam suficientemente fortes para que ao menos as reincidências
sejam evitadas. Um fato concretizado, por si só, não significa que deva ser
repetido, principalmente quando suas consequências se mostraram tão danosas.
Na
conscientização da realidade de mundo e de vida reside o primeiro passo para
que as tragédias sejam evitadas. Ora, se todo morador de uma comunidade evita,
por exemplo, fazer queimadas descontroladas ou acumular lixo defronte as
residências ou lugares baldios, e apenas um, com maldosa intencionalidade, faz
exatamente o contrário, certamente que sua ação irá prejudicar a todos. O
bueiro pode ser entupido pelo lixo jogado de apenas um morador. Um grande
incêndio pode ser provocado por apenas uma fogueira de quintal. Nos exemplos
dados, mesmo a conscientização da maioria encontra barreira naquela
irracionalidade ou premeditação do mal.
Ora, por que
a floresta é imensa, então logo se imagina que a derrubada de uma só árvore não
modifica em nada a sua pujança. Mas outro, com a mesma concepção, logo vai e
derruba outra árvore. E assim mais outros e mais outros. De árvore em árvore
derrubada, de repente surge a primeira clareira, depois o descampado nu, até se
transformar em completa devastação. O mais instigante é que todos, inclusive
aqueles responsáveis pelo desmatamento, sabiam que aquela floresta era
essencial à vida comunitária, pois purificando o ambiente, refrescando o ar, proporcionando
um clima mais saudável á população. Contudo, a simples ação de alguns
comprometeu a vida de todos.
Os poderes
públicos, seja por ação ou omissão, também incorrem na proliferação de
tragédias. Toda vez que se afastam de seus deveres abrem as portas para as
ambições privadas, para interesses escusos que acabam produzindo danos
incalculáveis a populações inteiras. Quando uma barragem se rompe e na sua
voracidade lamacenta vai provocando mortes e destruições, certamente que ali
estava instalada sob justificativa de desenvolvimento e progresso local. O que
não dilui a certeza de que a segurança da população estava em risco. Mas a
força do forte se impõe perante o fraco, e somente quando a destruição acontece
é que o frágil é valorizado enquanto vítima. Assim acontece com as tragédias
anunciadas.
Assim as
nossas tragédias comuns. E assim porque, para alguns, tanto faz que o mundo
vire se eles se mantêm de pé. Ou que eles repousem bem enquanto outros convivam
com sobressaltos.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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