*Rangel Alves da
Costa
Jamais
pensei em acreditar nisso. Mas dobro-me à sabedoria para rever minhas opiniões.
Eis que de três pessoas eu já ouvi que a pedra fala, que a pedra tem voz. E
mais: sentimentos.
O velho
sertanejo me disse: A pedra fala e fala muito. Basta sentar em riba ou ao lado
e logo a pessoa escuta sua voz. É como se não ouvisse nada, mas ela vai falando
por dentro da pessoa. E com ela também converso. E muito. Por isso mesmo que
tanto dizem que converso sozinho.
O velho sábio
me confidenciou: Doce e meiga, ruidosa e gritante, é a voz da pedra. Tudo
depende de quem vai ouvi-la. Não adianta chegar junto à pedra com estupidez e
ignorância e desejar ouvir uma palavra branda. A brandura da palavra da palavra
será sempre uma resposta àquela voz que chega mais silenciosamente íntima do
que bradando ao vento.
O velho
filósofo me afirmou: Oh se soubessem os segredos das pedras. Oh se imaginassem
a sabedoria das pedras. De endurecido semblante, de impenetrável feição, de
insensibilidade e desdém, é o que erroneamente pensam da pedra. Ora, não
conhecem seu íntimo, seu coração, sua voz. E nem será preciso colocar ouvidos
rente ao seu corpo, bastando olhá-la ao longe e já compreender quantos séculos
de sabedoria ali guardados.
Imaginem-se,
então, as esculturas talhadas na pedra. Seus silêncios não dizem nada. Suas
aparências não dizem além de uma feição petrificada. Contudo, basta que o olhar
se alongue em observação, que a compreensão procure se aprofundar um pouco mais
sobre aquele significado, e então a mera visão logo se transforma em achado, em
proximidade, em contato. Então será possível um diálogo.
Mesmo a
pedra bruta, a pedra do mato, dos escondidos, não deixa de revelar uma
significação especial. O tempo passando, os anos se somando, a natureza ao
redor se transformando, e ela ali como em estado de eternidade. E sempre um
testemunho do novo e do velho, sempre uma lição aprendida no tempo e somente
revelada quando a pessoa procura avistá-la com outro olhar.
Nos
rochedos pedregosos assim também. Não são apenas pedras sobre pedras ou uma
junção delas em imensidões de tamanhos. Como faróis que se acendem sobre as
águas e que tudo conhecem de suas histórias e seus segredos, assim também com a
imponência pedregosa que se lança acima das margens dos rios, que pontuam entre
os caminhos, que estão nos impenetráveis caminhos.
Não são
apenas pedras. São pedras vivas. Possuem células, possuas microrganismos,
possuem partículas, possuem veias, possuem pulsações, sentimentos, corações. E
falam e ouvem, e cantam e choram, e adormecem e despertam sempre no mesmo
lugar, noite a noite e dia a dia, sob sol e lua, sob brisa e ventania. Até que
um dia morrem e viram pó. E ao pó retornam na lei cristã da existência.
Confesso
que sou muito amigo das pedras, principalmente daquelas desoladas no meio do
tempo. Mesmo sem perceber, todo ser humano acaba sendo amigo da pedra. Depois
de uma caminhada, de o corpo pedir um instante de repouso, logo procura uma pedra
para sentar e descansar. E a pedra sempre acolhe. É neste momento que um
diálogo mais próximo tem início.
Depois de
sentar e se sentir mais descansado, daí em diante a pessoa começa a pensar em
coisas, em pessoas, em situações. É um diálogo do consciente, da memória, da
recordação. A pessoa não sabe, mas a pedra espera que o diálogo também se volte
a ela. Como um bom sacerdote em confissão, espera que o fiel vá se revelando.
Então, é
chegado o instante que a palavra, mesmo em pensamento, seja voltada à pedra.
Ela ouvirá cada silenciosamente. E silenciosamente responderá. A pessoa nunca
levanta de uma pedra sem a sensação de ter reencontrado um velho amigo. Da
pedra levanta com a lição, com a solução de problemas, pronto para seguir em
frente.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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