*Rangel Alves da Costa
Não há
momentos mais significativos que aqueles envolvendo a boca da noite. Esta
quando chega traz consigo toda uma simbologia ao mundo sertanejo, nas
distâncias interioranas de meu Deus. Chega sombreada, porém iluminada de cinzas
do sol, orante, cativante, cheia de fé. É na boca da noite que as saudades se
assomam aos olhos e corações entristecidos, que as mãos trêmulas se põem em
oração, que os credos e ave-marias silenciosamente ecoam. É na boca da noite
que tudo parece mais distante, mais saudoso, mais nostálgico e romântico. A
ventania que passa levando folhagens, as vozes do vento relembrando sussurros e
nomes. Em tudo uma canção antiga, ouvida mesmo sem canto algum. É o despertar
do passado trazido pela boca sombreada da noite. Ainda que os ofícios chamem ao
fazer, pois com café e cuscuz no fogão, ainda que as últimas roupas tenham de
ser buscadas no varal, ainda que a vela tenha de ser acesa junto ao oratório, é
a mente que mais convive, se encanta e se martiriza, com a boca cheia de noite
e poesia. Há gente que chora ouvindo o dobrar dos sinos, há gente que finge ter
paz quando se atormenta por dentro. Ah que saudade tanta! Logo ouviria uma voz
de mãe chamando ao café. Mas agora somente o silêncio e a relembrança do último
adeus. E mais tarde a lua inteira para navegar sobre os olhos d’água.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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