*Rangel Alves da
Costa
Estava
como angustiada, nervosa, olhando o relógio de minuto a minuto. Levantava a
cabeça a todo instante e sempre em direção ao poente do sol. Depois seguia um
pouco mais adiante e voltava. E assim seguidamente.
Depois das
quatro horas da tarde, então passou a se mostrar ainda mais apreensiva. Seus
olhos não procuravam outra direção senão os lados do poente, lá nas distâncias
do horizonte. Quando já estava se aproximando das cinco horas, de repente
fechou a porta e saiu.
E saiu
olhando para o alto, mirando na direção do sol. Já ao entardecer, sem a pujança
de antes, o sol começava a fazer seu caminho de volta. Não era mais o astro
brilhoso, de intensa luminosidade, apenas um resto de luz se preparando para
adormecer sua chama.
O que
pretendia, então, aquela mulher caminhando em direção ao pôr do sol, como se
fosse possível alcançar seu resto de luz? Mas o que ela pretendia era
exatamente alcançar o sol no seu instante de adeus. Ela queria abraçar aquele
resto de luz como se ali estivesse um ato de última vontade.
Como se
cegasse diante de tudo, ia pulando cerca, passando por debaixo de arame,
vencendo perigos, sempre seguindo adiante em direção ao poente. Por estradas,
veredas, por dentro do mato, e sempre olhando para o alto, mais parecia uma
enlouquecida buscando um alento para o seu tormento.
Quando
mais caminhava mais tudo lhe parecia mais distante. Imaginava o avermelhado do
sol já perto de si, mas novamente olhava para sentir suas cores distantes, como
que escondidas entre as nuvens. Mas não podia parar. Sabia - conscientemente ou
não - que não demoraria para que o sol sumisse de vez e as sombras da noite
escurecessem sua estrada.
Por isso
tinha pressa, tinha de chegar o mais rapidamente possível. Olhando para o alto,
sentia que o amarelado já havia tomado uma cor alaranjada, e que o afogueado já
estava transformando aquele ponto de luz em vermelhidão. Era como se o fogo
avivasse para depois as chamas avermelhadas se consumirem em si mesmas até se
transformarem em cinzas.
E ela
tinha de alcançar o sol antes que as nuvens encobrissem de vez sua última luz.
Precisava fazer aquilo, necessitava daquela última luz, tinha de chegar a tempo
de sentir tudo de perto, ainda que somente as brasas fraquejantes daquele adeus.
Mas será se haveria tempo? Quanto mais caminhava e corria mais a luz se
distanciava e parecia querer apagar de vez.
Estava
cansada, exausta, lanhada de espinhos e pedras, suja de terra, com as roupas rasgadas,
ferida e sangrando nas mãos, nos pés e nas pernas. Olhos vívidos, abertos,
petrificados, feição desesperada, alma angustiada. Quase não suspirava, apenas
ofegava a cada passo apressado diante daquele louco desejo, perante aquela
insana vontade.
Louca,
débil, insana? O que faz uma mulher agir assim, esperar o sol tomar seu rumo de
despedida e depois sair apressada em direção ao seu portal de adeus? Doida
varrida, transtornada mental, completamente maluca? O que faria uma mulher
imaginar que caminhando e correndo poderia alcançar o sol no seu poente?
Não é da
normalidade humana agir assim. De qualquer modo, desde a primeira luz do
amanhecer, passando pelo dia até chegar sua despedida, o sol sintetiza a
própria vida em seu percurso: nascer, viver, morrer. Surge belo, fulgura
resplandecente, para depois lentamente se esvair.
E o pôr do
sol simboliza os sonhos não alcançados, os desejos não conseguidos, os
objetivos de vida que não foram colocados em prática. Então, de repente, a
pessoa desperta e sente uma vontade imensa de tudo conseguir a partir daquele
instante. E vai enlouquecidamente em busca de realizar naquele tempo que lhe
resta viver. E numa fase da vida onde a manhã já se foi, o dia também, e agora
só resta a beleza do pôr do sol.
O pôr do
sol afeiçoa-se, assim, ao que resta do sol e o que resta na pessoa humana. Ali
o seu último brilho, o seu último instante de força e de beleza, para depois
tudo acabar em sombras em cinzas. O sol renasce na manhã seguinte, mas com o
ser humano é diferente. Há somente uma vida. E nesta, para tudo realizar.
Por isso
mesmo aquela vontade insana daquela mulher em alcançar o pôr do sol. Os
sofrimentos da vida já haviam lhe consumido o poder de realizações, e agora,
mentalmente afetada, via naquele pôr de sol sua última esperança. Mas não
conseguiu. Exausta, sem poder seguir adiante, apenas conseguiu avistar a última
réstia de sol.
Chorou, gritou,
abriu os braços para o alto, quis voar. E como estátua permaneceu olhando para
o alto enquanto as nuvens recobriam tudo. Já não havia pôr do sol. As sombras
da noite chegavam. Então ela desabou. Também se pôs. Para não renascer.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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