*Rangel Alves da Costa
Sempre acordo cedinho. E ao levantar sempre
deixo uma moça dormindo na minha cama, no outro lado do colchão onde a noite
inteira eu senti junto a mim o pulsar de sua presença.
Desperto pelo despertador biológico. Pouco
passou da madrugada e já me vejo impulsionado a levantar. Mesmo que depois eu
retorne por alguns instantes, o meu dia já começa naquele primeiro abrir de
olhos.
Difícil levantar e deixar ali tão
poeticamente adormecida a moça bela. Mesmo na semiescuridão do quarto, seu
corpo sobressai-se sobre os panos e suas curvas perfeitas se estendem como sereia
ao repouso.
Semblante suave, aparência terna e angelical,
cabelos longos e macios espalhados além do travesseiro. Apenas suspira,
levemente, num adormecimento sereno e profundo. Mansamente toco sua pele, permito-me
beijar uma flor, e depois a deixo em seu sono.
Ao tocá-la, e ao levemente passar minha mão
sobre seu corpo desnudo, de repente sou levado à dúvida do que fazer além desse
breve carinho. Quero tocá-la mais, mais forte, percorrendo o seu corpo inteiro.
E me aproximar ainda mais, roçando o meu corpo no seu, tomando-a em meus
braços.
Mas seria a certeza de despertá-la em seu
necessário repouso. E, despertando-a, desejar ainda que retribua minha carícia,
meu afago, meu desejo de homem. E talvez, no momento, ela queira somente
descansar. Por isso toco apenas o meu lábio na sua face e devagar me afasto
para outros afazeres.
Como logo depois me sento um pouco mais
adiante para escrever, para as primeiras linhas do dia, toda vez que olho ao
lado avisto uma deusa adormecida. Deixo sempre a porta aberta para que assim
aconteça. Vou teclando, escrevendo, mas sempre desejoso de olhar ao lado.
Ao olhar de lado, na direção da porta aberta,
com as primeiras luzes do alvorecer já presentes, então visualizo nitidamente a
bela moça dormindo. Estende-se suave sobre os panos da cama, as cobertas já não
encobrem o corpo inteiro, suas costas estão nuas, seu rosto parece sorrir para
mim. E sua boca a me chamar.
Fecho os olhos e passo a imaginar o que
poderia acontecer se naquele mesmo instante eu retornasse ao seu lado. E ainda
de olhos fechados começo a pensar se os seus olhos estivessem abertos e sua
boca e suas mãos me procurassem sem palavras, apenas em gestos e toques,
carinhos e carícias.
Fico a imaginar se da proximidade nascesse o
passeio de mãos sobre a pele, se da boca nascesse o beijo, se das mãos
nascessem o abraço, se do abraço nascesse a busca, se da busca nascesse o
desejo incontido. E se de repente, sem que nada mais nos prendessem em
carinhos, somente nossos pulsos e impulsos aflorassem.
Mas por que tanto imaginar se tudo isso é
possível com a moça dormindo ao lado? Por que tanto imaginar se tudo isso já é conhecido
pelos nossos corpos? Por que tanto imaginar se todo acontecimento neste sentido
já não será tido como experiência nova ou sonho enfim realizado?
Pelo amor, simplesmente. Imaginar e querer
mais do já conhecido, somente se explica através do amor sentido. Somente o
amor para renovar os desejos, os sentidos, as aspirações do corpo e da alma.
Somente o amor para sentir aquela moça como diferente de todas as outras
mulheres. Não é a mulher, é a minha namorada.
Enquanto escrevo estas linhas, olho de lado e
avisto a moça dormindo. E quanta beleza naquela moça, naquela minha namorada.
Não escrevo isso como confissão de amor ou para que ela leia. Ela merece um
poema. E a ela declamo um a cada dia, bem baixinho, ao seu ouvido.
E ela sente no verso o quanto amo e quanto
quero aquela moça dormindo ao lado, junto e dentro de mim.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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