*Rangel Alves da Costa
Já foi
dito aqui sobre quando Lili Cangaceira foi raptada pelo Coronel Severo. E que
também depois disso houve uma batalha sangrenta. De um lado, o grupo cangaceiro
comandado por Ivanildo Silveira, e do outro, pela honra dos coronéis, o Coronel
Archimedes. Nem queiram saber o fim dessa refrega. Ou queiram, pois vou contar.
E vou
contar quase com punhal no pescoço. Ou coisa pior, pois fui ameaçado de até ser
salgado e exposto no arame acaso não leve ao mundo a verdadeira história do
rapto dessa verdadeira Sabina pelas mãos do ardiloso Coronel Severo. E quem me
forçou a fazer isso, a conta tudo, tim-tim por tim-tim, foi nada mais nada
menos que o potentado Coronel Aderbal Nogueira, o raio da silibrina em forma de
gente. Eita fi da gota temido.
Certamente
que contarei ao mundo, pois no Mundaréu e arredores ainda hoje não se fala
noutra coisa. Mesmo já passados todos esses anos, mas parece que não há outro
proseado melhor do que quando a bela e sibite cangaceira caiu nas graças do
perigoso Severo e por este foi abocanhada quase em meio à cangaceirama. As más
línguas chegam até dizer que não houve bem um sequestro, mas um oferecimento da
fogosa Lili para ser carregada nos braços do coronel. Mas vamos lá, antes que
Coronel Aderbal aviste o cuspe secando.
Pois bem.
Naqueles idos do tempo, o bando cangaceiro descambou do sol que nem lagartixa
suporta do Raso da Catarina e veio num galope de pé cortando a mataria agrestina
até se abeirar do coito do Mundaréu. Não era a primeira vez que o bando chegava
ali, pois quase como passagem para outra banda da Bahia através de Sergipe. Mas
não só por causa disso não, pois os mandachuvas de Mundaréu tudo amigo e
protetor do líder da cangaceirama. Assim como os coronéis Paulo Gastão, Antônio
Vilela, Ângelo Osmiro, Kydelmir Dantas, Raul Menelau, Romero Araújo, Antônio
Corrêa Sobrinho e Geziel Moura, dentre muitos outros.
Ainda hoje
é famosa a trova do tremelico: “Paulo Gastão se treme todo quando avista
cangaceiro e o tremelico só passa quando dá muito dinheiro...”. Já com o
Coronel Ângelo Osmiro diziam: “Eu conheço um coronel que paga bem a coiteiro e
pra não ser ameaçado manda sacos de dinheiro, mas um dia viu o bando e a correr
foi o primeiro...”. Interessante também a invencionice popular com relação ao
Coronel Kydelmir: “Foi Coronel Kydelmir que disse que ia capar cangaceiro e que
se algum aparecesse esse era o derradeiro, mas quando o bando chegou serviu de
bode a carneiro e ajoelhado prometeu ser um servo por inteiro...”.
Foi, pois,
em meio a esse mundo de poderosos, de coronéis donos do mundo, que o bando se
estabeleceu depois das andanças do Raso até o Mundaréu. Bando comandado pela
liderança absoluta do Capitão Ivanildo Silveira, também conhecido como “da
lei”, era sem dúvidas o segundo maior cangaceiro de todo o chão nordestino, eis
que o outro todo mundo já conhece em verso, prosa e bala. A intenção de seu
bando era ficar pouco tempo, apenas descansar e seguir viagem rumos às terras
de Exu, onde se dizia que havia um sanfoneiro sem igual. E o bando era
apaixonado pelo ronco da boa sanfona.
Já perto
da partida, eis que o coiteiro Carlos Mendonça correu para avisar ao poderoso
Coronel Severo, o famoso Manoel Severo das terras-sem-fim, sobre a existência
no bando de uma cangaceirinha que era a coisa mais linda do mundo: Lili
Cangaceira. Dizem que era a Brigitte Bardot dos sertões, a Marilyn Monroe dos
carrascais, a diva que fazia a lua apaixonada e o sol em tempo de endoidar. E
também quase endoida o Coronel Severo. Talvez até tenha malucado mesmo perante
tanta beleza da Lili Cangaceira.
Coiteiro
de honra vendida, logo Carlos Mendonça fez chegar aos ouvidos de Lili que logo
mais adiante um coronel a esperava com um saco de ouro. E Lili foi. Assim que a
cangaceira se aproximou, então Severo deu início ao sequestro. Lili ora gritava
me deixe, ora me leve, ora me solte, ora me agarre. Enquanto isso um barco já
os esperava nas beiradas do Velho Chico. Mas coisa feia veio depois, assim que
o mesmo coiteiro correu para agradar o Capitão Ivanildo e dizer que a bela Lili
havia sido sequestrada pelo famoso coronel.
Essa
história dá um livro. Mas vou dizer apenas que nas disputas entre as honras, de
um lado a honra cangaceira e na outra a honra coronelista, enquanto o Capitão
Ivanildo avançava o Coronel Archimedes Marques já o esperava por detrás do
serrote. Quem venceu a guerra? Ninguém. Talvez somente Severo e Lili, que
viveram felizes para sempre.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário