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sábado, 6 de fevereiro de 2016

TRISTES TRISTEZAS TRISTES


Rangel Alves da Costa*


As alegrias existem, todos sabem. As exultações e os contentamentos também. Neste momento muitos estão sorrindo, felizes, satisfeitos, bem sei. Dádiva ao que encontra sua motivação, sua propensão ao instante de alma confortada e cheia de graça. Muitos têm momentos assim, experimentando todo o encanto da vida e do mundo. Mas agora apenas silencia e entristece.
Há muita tristeza neste momento, por todo lugar. Aliás, é muito mais um permanecer do que um estar. Pessoas existem onde as tristezas parecem uma constância sem fim. Ainda que os sorrisos despontem e as alegrias aflorem, tudo se afeiçoa mais a um véu sobre a face do que mesmo reflexo de um estado interior. É como se a aparência, fingindo um estado emocional, tentasse resguardar o verdadeiro sentimento.
Não será preciso nenhuma motivação dolorosa. As perdas, os adeuses, as distâncias, as saudades, as desesperanças e desilusões, provocam sofrimento e não tristezas. Estas não necessitam de acontecimentos ou de fatos, de memórias ou recordações, para se revelarem. Por ser algo inato, que já se encontra interiorizado, então suas motivações aparecem até mesmo num instante de festa.
Alguém diria: tristes das tristezas tão tristes. E acrescentaria: uma bela pintura numa moldura angustiada e melancólica. E terminaria afirmando: talvez não seja correto pensar assim, vez que a beleza da pintura pode mesmo estar na feição entristecida de sua moldura. Mais acertado pensar assim, pois as faces tristes, por não estarem marcadas pelo grito silencioso nem pela pujança da dor, mas apenas pelo desalento, acabam se tornando singelas e cativantes.
É fácil reconhecer pessoas assim, de tristes tristezas tristes. Elas caminham pelas ruas como se estivessem distante de tudo, falam com as pessoas sem emoção ou afagos, caminham sem pressa ou correria, levam no olhar uma direção às distâncias, aos horizontes, aos desconhecidos. Seus olhos se ausentam do fulgor, do brilho, da incessante busca pelas paisagens. Mesmo abertos e voltados para pessoas ou lugares, não se pode afirmar que esteja enxergando alguma coisa.
Há assim uma pessoa debruçada na janela ao entardecer. Mesmo diante de uma paisagem bonita, mesmo perante as alegrias que passam, simplesmente permanece alheia a tudo. A lágrima não escorre pela face, mas quem a avista logo imagina um rio se derramando a qualquer momento. Mas não chora. Não é tristeza de chorar, apenas de sentir, de vivenciá-la em todos os sentidos, até que ela se resguarde sem ir embora de vez. Eis que a tristeza sempre permanece com seus invisíveis sinais.
Não está no velho solitário sentado no banco da praça, mas está na mocinha recolhida ao seu quarto, com a luz apagada. Não está na pessoa que vive puxando o lenço para enxugar os olhos por todo lugar, mas está naquele que sobe ao monte e ali no cume permanece sem pensar em retorno, sem sequer perceber que a noite chegou. Não está na notícia, no espanto nem no convívio de difícil situação, mas está no olhar que saindo à porta e vai se alongando pelas distâncias, além das nuvens, além das montanhas, além de tudo, ainda que pouco importe que alguma coisa possa ser avistada.
A verdade é que as tristezas tristes são as tristezas mais belas que existem. São como as sublimes poesias que enternecem ao invés de afligir a alma, são como os versos escritos como folhas de outono, como solidão de jardim, como florada que vai se embalando pela ventania. Por detrás da vidraça embaçada, em tardes chuvosas, a um olhar tristonho de tristeza triste. E ninguém afirmará da dor perante uma expressão de puro sentimento.
Há no silêncio e na solidão um chamado a essa tristeza, a essa tristeza tão triste. Porém nem tudo mundo poderá senti-la. Somente os que assim a vivem compreendem o mistério dessa lágrima que nunca necessita ser chorada para desaguar pelo mar sem fim, pelo além-mar da alma e do sentimento.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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