*Rangel Alves da Costa
Não vou
desatinar meu destino de ter nascido nordestino, pois isso orgulho maior e
coisa que mais estimo. Orgulho de ser sertanejo, da flor do mandacaru no meu
beijo, do vaga-lume o seu relampejo. Orgulho do meu Poço Redondo, onde nasci e
não escondo e vou sua história compondo. Não há orgulho maior de ter a lua e
ter o sol, da terra nua e seu arrebol, vida minha e vida sua, floridas igual
girassol. Orgulho do meu sertão, do Padim Ciço e Lampião, de Alcino e Zé de
Julião, de todo Zé e todo João. Relembro o tempo antigo do casebre como abrigo,
do vaqueiro e seu perigo, da seca maior castigo. Porta aberta ao madrugar, pra
barra do céu logo olhar, e nos olhos a esperança e o temor de não trovejar. Sou
de um sertão de humildade, de pobreza sem maldade, no homem a sinceridade, no
viver a honestidade. Homens de mãos calejadas, de faces de sol enrugadas, de
alpercatas e pegadas, nas sinas e nas estradas. Nos tempos de antigamente,
potes na cabeça e rodilhas, cabelos presos em presilhas, roupas de chitas em
barrilhas, em tudo as maravilhas. Moringa na janela da tarde, em tudo uma
saudade, doce de cocada de frade e a gostosura em alarde. Quixaba nos
escondidos da mata, araçá trazido em lata, araticum juntado em cascata, vida
doce e tão pacata. Panela de barro no chão, graveto para o fogão, e por riba do
tição o toicinho em queimação. Comer em prato de estanho, coisa que é hoje
estranho, mas que nas mesas humildes era luxo sem tamanho. Ouvir o sino tocar,
e logo a beata a rezar, Marizete leva o santo e na voz o seu belo cantar, pela
rua em procissão, pela estrada em maior devoção, a religiosidade de um povo na
sua santa missão. Cavaleiros e cavalhadas, pegas-de-boi e vaquejadas, festas de
mato e caçadas, saudades pelas estradas. Nas calçadas mais antigas, os
proseados de amigas, falando se santas e raparigas, dos milagres e das
intrigas. Nas tardes de bordadeiras com suas mãos tão ligeiras, traçando os
bilros nas beiras, assim aquelas vidas rendeiras. Ralar o milho em quintal,
ovos na gordura animal, colocar tudo na mesa e ter o de comer sem igual. Assim
a vida de um povo tão renegado no novo, mas por tudo ainda louvo e só de pensar
me comovo. Pois sou de um sertão assim, de um tempo do sem-fim, e mesmo que
tudo em trampolim, nada se faz tão ruim. Acredito no sertão, pois amo este meu
chão, é como uma fé chamejante bem dentro do coração. Pois este filho de
Alcino, que um dia foi tão menino, traz no seu figurino a feição ensolarada de
sertanejo genuíno. E ama tanto o seu chão que canta em verso em canção, a vida
desse seu povo que tem na moradia o sertão.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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