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sexta-feira, 28 de setembro de 2012

EU QUERIA RIR (E DEPOIS SORRIR) (Crônica)


                                    Rangel Alves da Costa*


Sorrir deve ser muito melhor, muito mais gostoso, do que simplesmente rir. Por isso mesmo eu queria rir e depois sorrir.
Podem até imaginar que as duas ações são iguais. Mas verdade é que são diferentes, ainda que tanto uma como outra estejam inseridas no contexto do sorriso. E este entendido como expressão de alegria, satisfação, contentamento.
Mas será que o rir, ou o riso, é sempre manifestado esbanjando alegria, aflorando plena satisfação? Será que o ato do sorrir, ou sorriso, espelha fielmente a satisfação íntima, o momento contagiante do espírito?
Explico logo porque há diferença entre rir e sorrir. São sutilezas sensoriais, dos sentimentos e das expressões internas, pequenas e quase imperceptíveis, mas que possuem causas e consequências bastante diferentes.
O rir é apenas uma ligeira, rápida, acanhada manifestação de aceitação ou contentamento. Denota a aceitação de algo ou como confirmação positiva. Manifesta-se através de uma contração agradável nos lábios, e expressa um sorriso apenas terno, apenas gestual, sem ruído ou estardalhaço.
Já o sorrir é mais visível, constatável e até audível. Neste, os lábios acompanham o tamanho da alegria, da satisfação, do prazer. No sorrir, a alegria irrompe a mera satisfação para se transformar em graça, em ruído, em contentamento aflorado, cujo brilho é também manifestado no olhar. O passo seguinte pode ser a gargalhada, a risada barulhenta e prolongada.
Perceberam as diferenças? Monalisa está levemente rindo, o palhaço está sorrindo; a pessoa vai apenas rir quando olha para outra com carinho e afeição, e vai sorrir quando recebe um buquê perfumado de presente; alguém está rindo por dentro e quase imperceptivelmente por fora quando embala o bebê para dormir, e estará sorrindo ao ouvi-la tentando pronunciar seu nome.
Por isso mesmo que eu queria primeiro rir para depois sorrir. Rindo demonstro verdadeira satisfação, mostro que estou contente, expresso minha alegria íntima diante do que vejo e sinto. Rindo cultivo o campo para a felicidade maior, para alcançar motivos que expressem a satisfação de uma maneira mais contundente, para sorrir.
E quero primeiro rir para não fingir o tamanho do sentimento, para não exagerar naquilo que mereça apenas o prazer da leve contração labial. Ademais, é fácil demais perceber a veracidade do sorriso, a autêntica felicidade, o gesto que não seja forjado. Quando assim acontece, o passo seguinte é a angústia por dentro.
Quero anteceder o sorrir com o rir, porque quando aquele chegar será tão verdadeiro como o motivo que me faz contente. Quando o sorrir aflorar tomará toda a face, trará aperto e brilho nos olhos, fortuna ao coração, uma vontade imensa de prolongar a melodia sensorial. E preciso sorrir assim porque a grandeza da felicidade não se contentará apenas com o rir.
Contudo, que não me venha nem o rir nem o sorrir se não forem acompanhados da graciosidade do coração, do júbilo da alma, do regozijo do espírito. Como desejo a verdade em tudo que aconteça, também preciso expressar veracidade na reação positiva. Seria martírio fingir o riso, seria doloroso demais mover os lábios apenas mecanicamente; seria cruel demais revelar um sorriso que mais pareça um grito de dor.
Eu quero rir vendo você chegar, quero rir ao te dar um abraço, quero rir seguindo seu passo, quero rir junto com todo o meu eu que ansiosamente espera os motivos para sorrir; e depois quero sorrir correndo pelos campos, dançando a valsa debaixo da chuva, quando você esquecer o meu nome e chamar meu amor. E juro que será tanta a felicidade que meu coração experimentará a risada incontida da graça maior em viver.
  

Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
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