Rangel Alves da Costa*
“Musica, música...”.
“Canto que encanta a alma...”.
“Que bom que toda melodia ao menos se aproximasse dessa doçura, dessa singeleza, desse silencioso voo...”.
“As Quatro Estações. Primavera. Antonio Vivaldi...”.
“Das quatro estações acho esta, a primavera, realmente a mais bela. Remete-nos à dança das flores, ao bailado dos colibris, borboletas voando ao redor...”.
“O que mais me fascina é a transmissão visual que essa valsa permite. Estamos apenas ouvindo, mas também presentes num jardim, em meio a pétalas e coloridos...”.
“A música clássica tem esse dom de nos reportar, de nos fazer viajar...”.
“Triste daquele que não se encanta, que não se emociona com os Prelúdios, as Cantatas, os Noturnos, as Sonatas...”.
“Ouvir Bach e a sua Jesus, Alegria dos Homens é indescritível...”.
“Não só Jesus, Alegria dos Homens, mas também Os Concertos de Brandenburgo e Oratório de Natal. Sua música é grandiosa”.
“Gosto também de Mozart, Schumann, Chopin, Schubert, Beethoven. Porém revelo minhas preferências por Tchaikovsky e Strauss”.
“Certamente que pelos balés de Tchaikovsky e as valsas de Strauss, tanto o pai como o filho...”.
“Certamente, pois adoro o Lago dos Cisnes e o Quebra Nozes, de Tchaikovsky. E dos Strauss, preferindo a genialidade do filho, cito a encantadora Danúbio Azul.
“Sabe que eu sei o início da letra de Danúbio Azul?”.
“Nunca que eu soubesse. Por favor...”.
“Diz mais ou menos assim: Danúbio tão azul, tão brilhante e azul, através de vales e campos, você flui tão calmo, nossa Viena cumprimenta, sua corrente de prata, através de todas as terras você alegra o coração com suas belas praias. Longe da Floresta Negra você se apressa para o mar dá a sua bênção para tudo. A leste de fluxo, acolhe seus irmãos, uma imagem de paz de todos os tempos! Os antigos castelos são visíveis de baixo para o alto, agradecendo seus sorrisos de suas íngremes colinas escarpadas, e vistas das montanhas espelham em suas ondas dançantes...”.
“Que maravilha! Quem ensinou?”.
“Um velho amigo que todos chamavam de louco. Sua verdadeira loucura era a paixão pela música clássica. Morreu debruçado sobre um velho piano. Tinha ao lado a partitura de Barcarole, de Jacques Offenbach.
“Que gosto apurado, pois Barcarole é simplesmente divinal”.
“É sim, e faz parte da ópera Os Contos de Hoffmann. A própria música nos leva como numa viagem de barco, num passeio ao entardecer. Sua suavidade parece o sopro da brisa nessa viagem...”.
“Por que a maioria das pessoas ignora ou simplesmente não gosta de música clássica?”.
“Eis uma grande indagação dos nossos tempos. Mas tenho uma explicação para tal...”.
“O que seria, então?”.
“Na verdade, tudo parte de uma série de fatores: falta de cultura musical e de cultura de modo geral, as banalidades musicais que acabam ilusoriamente atraindo as pessoas sem senso crítico, o desconhecimento da feição sentimental do ser humano...”.
“Desconhecimento da feição sentimental do ser humano?...”.
“Sim. Quando o homem renega suas potencialidades sentimentais, acaba deixando de alimentar sua mente, seu coração e sua vida com as melhores coisas...”.
“E se entrega aos modismos...”.
“Os modismos são os portais de toda destruição. É moda ouvir baboseira, e a maioria ouve; é moda o duplo sentido musical, o imprestável, e a maioria rebola. Agora pergunte quantos abrem a janela ao entardecer, colocam uma música e começam a fruí-la, refletindo sobra a existência e a realidade da vida...”.
“São poucos, realmente”.
“Pouquíssimos. Apenas aqueles que sabem usufruir a melodia, viajar na canção, delirar no motivo musical...”.
“E tudo se transforma como na própria paisagem...”.
“Sim. A boa música inebria de tal modo que passa a fazer parte daquilo que de melhor o olhar se permite avistar...”.
“O horizonte, o sopro da brisa, a cor da tarde...”.
“E também a noite, o noturno solene e encantador...”.
“E acaba sendo acalanto para o adormecer em paz!”
Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
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