SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 26 de setembro de 2012

PALAVRAS SILENCIOSAS - 25

                           
                                       Rangel Alves da Costa*


“Queria dormir e sonhar com um deserto...”.
“Sonho tuaregue, beduíno, errante...”.
“Talvez um sonho miragem...”.
“Também com infinita distância, sede e calor...”.
“O areal como estrada e como espelho...”.
“Que sonho estranho seria”.
“Apenas um sonho diferente...”.
“Mas que não deixaria de ter muitas significações...”.
“Solidão, aridez, distância...”.
“Muito mais...”.
“O que?”.
“Deserto também significa procura, medo, ansiedade, silêncio cortante que dói na alma...”.
“Mas penso noutro deserto...”.
“O deserto do ser, da luta, da persistência?”.
“Do fazer tudo a partir do nada...”.
“O deserto e seu oásis...”.
“A esperança adiante...”.
“Mas pode doer, pois pode ser apenas miragem...”.
“As miragens não são todas e sempre. Os olhos que procuram um dia encontram...”.
“A persistência...”.
“A perseverança...”.
“Também o conhecimento sobre a realidade e saber lidar com ela...”.
“Sim. Basta ver no exemplo dos povos do deserto”.
“Aqueles nômades vagando de canto a outro...”.
“Mas não para fugir dali, apenas para resistir...”.
“Para sobreviver...”.
“Não deixa de ser uma vida profundamente poética...”.
“De uma poesia solitária, ardente, faminta, sedenta...”.
“Poesia assim será sempre realista...”.
“Mas de um realismo misterioso”.
“Realmente, há muito mistério no viver no deserto, cortando aqueles imensos bancos de areia...”.
“Imagino aquelas distâncias arenosas...”.
“Aqueles horizontes empoeirados...”.
“Aquelas vagas, dunas, caminhos sem curvas nem margens...”.
“Aquele sol ardente do dia, aquele frio insuportável ao cair da noite...”.
“Os seus caminhantes...”.
“Apenas pontos vagando pela imensidão árida e totalmente despovoada...”.
“Um zunido de vento, um não poder olhar para trás por causa da areia jogada no rosto...”.
“Os passos sulcados na areia, mas que já são recobertos no momento seguinte...”.
“Os olhos que se abrem pouco e avistam quase nada...”.
“E quando avistam nunca é o que parece ser...”.
“A sede, o cansaço, o calor, o frio, a incerteza...”.
“E uma tenda armada, o pão devorado, o pingo bebido, o levantar, o passo seguinte...”.
“Seguir em frente, é preciso caminhar sempre pelo deserto...”.
“E vão e voltam, porque não há destino certo, não há endereço, não há o que encontrar que justifique o ficar”.
“E retornam pelo mesmo caminho sem estrada...”.
“Por tantos caminhos que o deserto oferece...”.
“E num desses o sorriso, a alegria, o contentamento...”.
“Enfim, fazer valer de tanto esforço e sacrifício?”.
“Sim. De repente não há miragem, mas o oásis está bem à frente...”.
“O paraíso em meio ao inóspito...”.
“A água, os coqueirais, a sombra, o repouso...”.
“E a sua outra significação...”.
“Qual?”.
“O alívio, a consolação, o prazer entre muitos desgostos...”.
“Mas não tenho motivos para sonhar assim...”.
“Apenas o deserto imenso?”.
“Sim. A certeza que nenhum caminho é tão fácil e fértil...”.
“Nem tem oásis adiante...”.
“Mas há que ser vencido!”.



Poeta e cronista
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