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segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Palavra Solta: as velhas parteiras


Rangel Alves da Costa*


As velhas parteiras estão como que esquecidas pelos rincões interioranos. Hoje em dia, apenas raramente se utilizam os ofícios das mãos calejadas e experientes das velhas senhoras. Mas noutros tempos foi bem diferente. Nos dias de antanho, quando não havia hospital, maternidade ou mesmo posto de saúde nas distâncias matutas de meu deus, quando as dores de parir começavam a surgir o primeiro pensamento era seguir em correria atrás da velha parteira. O jumento era chamado ao dever e o aflito esposo esporava o lombo do bicho em tempo de enlouquecer, pois tinha pressa de logo chegar e trazer no mesmo passo aquela senhora. Geralmente no meio da noite, sob a luz do candeeiro, então aquelas mãos mágicas se lançavam aos mistérios sagrados e através de meios os mais impensáveis. Uma bacia de água, panos, toalhas, tesoura e a experiência de muitas vidas trazidas ao lume. Sem saber ler nem escrever, vivendo na pobreza e no abandono, morando em tapera de cipó e barro, aquela velha senhora ganhava uma importância indescritível nos momentos mais difíceis. Ou ela prestava os seus cuidadosos préstimos ou tanto a criança como a mãe podiam correr risco de morte. Mas elas, aquelas velhas parteiras sertanejas, como se agissem por inspiração sagrada em cada parto, somente sossegavam quando a criança chorava à luz da vida. E elas, com olhos também marejados de satisfação, levantavam os pequeninos ante as mães para dizer se era homem ou mulher. E depois retornavam cortando veredas até que novamente batessem à sua porta pedindo ajuda. E assim cem, duzentas ou mais vidas nascidas daquelas mãos humildes. E por isso mesmo madrinhas por gratidão de um sertão inteiro.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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