Rangel Alves da Costa*
Já fui menino malino, danado, já fui menino
pelado. Não somente eu, mas muitos na minha idade de meninice. Andava nu,
corria nu, brincava nu. Tempo bom o daquele nudez. Ademais, vivendo debaixo do
calor sertanejo, com o suor respingando em tudo e o poeirão das estradas e
descampados tomando conta da vida, seria até fatigante estar todo vestido. E
também porque o menino devia estar preparado para sair em correria a qualquer
instante, devia estar sempre disposto a se danar pelo meio do tempo, a brincar
e a malinar com tudo que houvesse ao redor. Em épocas de chuvarada então, seria
muita perda de tempo descer todas as roupas enquanto os pingos chamavam à
festança. As épocas das trovoadas deixavam a meninada num alvoroço danado. Em
tais períodos chuvosos, de pingo d’água maciço, toda a meninada corria junta
para o meio da rua. Ali, na festa da molhação, tanto meninos como meninas se
lambuzam nas poças, se fartavam embaixo das biqueiras, dançavam e pulavam à
vontade debaixo da nuvem. É como um retrato amarelado mostrando a nudez em
festa, os meninas de corpo inteiro e as meninas da calcinha pra cima.
Banhavam-se nos mesmos locais, debaixo das mesmas torrentes, se lambuzando
pelas mesmas poças, se jogando pelas mesmas calçadas, mas sem gracejos ou
piadinhas pela nudez, sem quaisquer tipos de insinuações. Apenas meninos
vivendo seu mundo.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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