SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Palavra Solta - vida ribeirinha ou o lamento das águas


*Rangel Alves da Costa


Perante o meu olhar, uma fotografia do Rio São Francisco e suas beiradas, com algumas embarcações e um leito raso de água. Lá em Bonsucesso, povoação sertaneja em Poço Redondo. Mas poderia ser em Curralinho, em Cajueiro, em Jacaré. Aquele que avista a fotografia logo se enche de encantamento. Não poderia ser diferente, pois tudo emoldurado numa beleza poética sem igual. O Velho Chico, mesmo padecente como está agora, magro e ossudo e com suas veias esvaídas, não deixa de encantar o seu beiradeiro e o seu visitante. Logo o espírito e alma bebem da magia do alvorecer e do entardecer. Verdadeiramente não há cenário mais mágico e cativante. Contudo, seria preciso avistar além da moldura para adentrar nas raízes do próprio rio, de seu meio e de seu habitante. A pintura de cores vivas se mostra apenas uma aparência. Há, na alma do rio e do seu povo, um âmago tomado por sensações muito diferentes daquelas tidas apenas pela visão do cenário. É um rio que sofre e um povo que sofre, é um rio que pranteia e um povo que chora, é um rio que vai se exaurindo nos braços aflitos de seu ribeirinho. Somente quem vive o dia a dia conhece a real situação. Somente quem nasceu e se criou nas suas beiradas conhece a dor da saudade de um passado de águas grandes, piscosas, cheias de vida e de embarcações. Hoje há apenas um leito. E quase de morte. Os vapores não passam mais, os navegantes seguiram outro porto. Cadê o surubim, há de se perguntar. Tudo passou, tudo seguiu na curva do rio. E nas beiradas ficou o seu habitante, o beiradeiro, o ribeirinho. Aquele que sorri no olhar e chora no coração.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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