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sexta-feira, 23 de abril de 2010

PRECISAMOS APRENDER QUE... (Crônica)

PRECISAMOS APRENDER QUE...

Rangel Alves da Costa*


Quem pensa a guerra, planeja e ordena que se faça o ataque deveria seguir à frente de suas tropas, de seus soldados e de seus comandantes, para saber como é estar no campo de batalha, na mira do inimigo, tendo que matar para não morrer. Se o primeiro canhão lançado do outro lado atingisse seu coração, não haveria mais guerra, pelo menos aquela, pois o homem nasceu para dialogar e não para guerrear.
Quem faz da vida uma aventura perigosa, enveredando pelos muitos caminhos do mau que se clareiam à sua frente, deveria pagar o mais alto tributo moral, social e jurídico assim que cometa o segundo erro, pois aquele que não aprende logo no primeiro deslize cometido é indigno de viver proliferando os seus desacertos perante a sociedade, atingindo pessoas que não tem nenhuma culpa pelas ervas daninhas que insistem em se alastrar ao lado dos frutos bons.
Quem faz da religião um verdadeiro comércio da fé, instalando templos, espalhando falsos sermões, iludindo a consciência de pessoas humildes e sem a devida noção crítica de realidade, tirando destas tudo o que for possível, com falsas promessas de salvação, deveria, a partir da primeira denúncia feita contra o seu culto, ser constrangido judicialmente para que prove a seriedade de sua pregação e, caso se confirme a prática de uso da fé para fins de enriquecimento ilícito, que tenha o seu templo fechado para sempre e que cumpra a pena segundo a gravidade do ilícito praticado. Se já há previsão legal neste sentido, que deixe de ser mera previsão para se tornar em efetiva aplicação face a estes comerciantes da fé.
Quem faz do seu corpo, ativa ou passivamente, objeto de comércio sexual, prestando os favores da carne em troca de qualquer moeda ou outras formas de recompensa, jamais poderá justificar sua atitude sob a alegação de que tal profissão é a mais antiga do mundo ou que o sexo pago é tão frequente – até mesmo entre os mais insuspeitos e de onde ninguém jamais se esperaria – quanto almoçar ou tomar banho. Tal alegação, querendo justificar a fraqueza moral e espiritual, deveria servir como exemplo maior e fundamento para que as pessoas se reconheçam muito mais importantes e fortes do que se trocar por um ou dois tostões, como se o corpo servisse somente para o uso e abuso dos outros e não para o orgulho e deleite próprio.
Quem faz dos seus momentos de lazer e convivência familiar um diálogo com a televisão e não com a família, deveria saber que enquanto se encanta com os modismos e as lições pervertidas, do mesmo modo os seus estão seguindo o mesmo caminho, e quando surgir – porque sempre surge – a necessidade urgente de dialogar para resolver algo que já se tornou num problema, as soluções encontradas serão tão fictícias quanto as suas vidas se tornaram, vez que já não sabem ser nem dublê de si mesmos. A família, nascida como entidade de amor e convivência harmônica, de repente se transforma num seriado enlatado, num reality show ou até, quem sabe, num desses canais eróticos que para entrar é preciso ter senha. Lamentável...
Quem faz do seu livro de cabeceira um caderninho com folhas contendo somente contas e mais contas, rabiscos e mais rabiscos, e a cada noite são acrescidos mais números de dívidas e preocupações, deveria rasgar este caderno e passar a carregar consigo um novinho em folha. Somente assim pensaria duas vezes antes de fazer do consumo exagerado uma prática viciosa e, com certeza, tomaria vergonha e evitaria estar a todo instante puxando o seu caderno novinho diante dos outros para colocar nele contas desnecessárias feitas ou para se fazer.
Quem faz do instante que tem na vida – pois mais longa que seja a vida, não passa de um breve instante – um desencontro com os bons hábitos, com a boa leitura e a boa música, com a reflexão sobre as pequenas coisas (que se tornam imensamente belas), com o enveredamento nos caminhos da filosofia e com o diálogo necessário com a loucura, jamais vai poder compreender que a vida é muito mais instigante do que realmente parece ser. E alguém já disse que se todos nós temos um pouco daquilo que é próprio dos loucos, que conheçamos de antemão a diferença entre jogar uma pedra e uma flor.
Quem faz da vida um tributo a si mesmo e uma homenagem de reconhecimento e valorização de sua existência, será sempre digno de respeito dos seus e das demais pessoas, pois o ser humano que sobre a terra habita não é somente um ser que nasce e que vai morrer, mas sim uma pessoa que será eternamente vista pelas construções éticas, morais e humanitárias que fez frutificar na sua passagem. Porque, parodiando Rudyard Kipling, "Tua foste a Terra com tudo o que existe no mundo, e - o que ainda é muito mais – foste um Homem, meu filho".



Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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