SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 8 de junho de 2016

Palavra Solta – dores do cais


Rangel Alves da Costa*


É belo o entardecer. Suas cores poéticas, instigantes, afogueadas, balançam ao sabor da ventania. Os coqueirais se embalam, dançam valsas de alegria e apressamento, se desfraldam como cortinas de um quarto alegre de uma moça bela. Pelos arredores e mais adiante, nas areias molhadas que se alongam por toda a margem, as conchas e os restos trazidos pelas ondas grandes. Passa a última revoada, um barco é avistado nas distâncias, o mar murmureja, se sacode, fala palavras desconhecidas. As pedras molhadas, lavadas, tingidas de sal e de sol, num negrume que espelha escuridão, silenciosamente observam tudo o que acontece ao redor. Os pescadores já se recolheram e levaram consigo seus cardumes de sonhos. Os caminhantes das vagas da noite ainda não chegaram para os seus passos incertos sobre as areias tristes. São pessoas que vão surgindo ora com flor à mão, ora carregando um conhaque, ou simplesmente com lenço à mão, que não demora para ficar encharcado. A tarde se vai, queima sua última brasa. A noite vai chegando solene e silenciosa. A luz do farol já não acende mais. A rainha das águas não deita mais sobre as pedras do cais. E este, na tristeza que todo cais possui depois do entardecer, apenas chora. Uma dor indecifrável, mas existente. Ou dores indecifráveis, mas subsistentes. Dores de amores desamados, dores de saudade, dores que surgem assim ao anoitecer, dores de tudo o que jaz sobre o cais.


Escritor
Blograngel-sertao.blogspot.com

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