*Rangel Alves da
Costa
O
capitalismo sente ojeriza pela cultura, pelo saber, pelo conhecimento, pela
cultura. Tal qual o poder, que abomina a educação, também o capitalismo não
gosta que o indivíduo se torne num ser pensante e assim possa criticar sua
voracidade.
Sendo a
acumulação de riqueza o esteio do capitalismo, logicamente que este não
objetiva outra coisa senão somar, acumular, ter mais ganho, mais lucro. Por
consequência, na outra ponta está o sujeito que precisa usufruir dos bens e
mercadorias e que, por isso mesmo, se depaupera, gasta, empobrece, se diminui.
Para o
sistema capitalista tanto faz que a sociedade seja mais ou menos letrada, tenha
mais ou menos noção do real, bastando-lhe apenas que seja uma sociedade de
consumo, de compras e aquisições cada vez maiores. Sobrevive e engorda
esvaziando o bolso de cada um e, faminta como é, disseca do indivíduo até a
última sombra de seu salário.
Ante uma
situação tal, qual seria a contribuição que o capitalismo faminto tem a dar à
cultura? Ou, por outras palavras, qual a importância que o capitalismo dá à
cultura de um povo. Na maioria das vezes, absolutamente nenhuma. A não ser
alguns e raros mecenas modernos, o que se observa é o mundo capitalismo dizendo
não a qualquer tipo de apoio ou contribuição à cultura.
Estou organizando
um evento denominado 1º Encontro de Descendência do Cangaço, que será realizado
no próximo dia 17, em Poço Redondo, no sertão sergipano, e me deparei com todas
as portas fechadas do grande comércio e do meio empresarial. Entreguei
pessoalmente ofício a cada portentoso empresário, explanei sobre o evento e sua
importância para a região, mas não consegui qualquer tipo de patrocínio, ainda
que todos se comprometessem com a causa.
Então,
ante a certeza que o meu pleito não terá qualquer acolhida, escrevi numa rede
social: “Poço Redondo
aprendeu cedo a voracidade capitalista. O comércio, incluindo grandes lojas e
supermercados, procura tirar do bolso da população até o último tostão. Mas não
dá um vintém sequer para um evento cultural voltado para a mesma população.
Quer dizer, usufrui de sua economia e se torna verdadeiro inimigo de sua
cultura. E bem sei por que assim afirmo”.
Mas é esta
a realidade. Mesmo numa pequena cidade interiorana, o grande comerciante em
nada retribui de tudo aquilo que a população lança aos seus cofres. É como se
somente o povo tivesse a obrigação de comprar, comprar e comprar muito mais, e
o empresário enriquecer, enriquecer e enriquecer muito mais, mas não há
qualquer reconhecimento quando é procurado para prestar qualquer contribuição a
um evento cultural em benefício da sociedade que lhe tem mera serventia de
acumulação.
Significa
ainda dizer que o povo não tem outro direito senão ser seu cliente, gastar na
sua loja, supermercado ou outro comércio, esvaziar totalmente os bolsos e ainda
ficar devendo, e novamente ir trabalha para matar sua sede e sua fome de
acumulação capitalista. Parece ser uma obrigação. E talvez assim seja na visão
capitalista, onde o povo não tem direito ao conhecimento, ao saber, à cultura.
Ora, o
evento possui relevância no contexto histórico sertanejo, pois objetiva reunir
não só os descendentes de ex-cangaceiros e ex-coiteiros como a população em
geral, num ato de confraternização, diálogo, reconhecimento e valorização. São
pessoas cujas linhagens possuem grande importância histórica e hoje vivem
relegadas ao esquecimento de suas raízes. E o município de Poço Redondo foi o
que mais filhos deu ao bando de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião.
Os
parentes dos cangaceiros e coiteiros que se espalham por todo o município
precisam ser chamados ao conhecimento de todos, reconhecidos e valorizados, vez
que fazem parte da própria história sertaneja. O evento, através de exposição,
palestras, atrações culturais e outros festejos, objetiva esse congraçamento
entre o sertão e o sertão, ou seja, entre aqueles descendentes e todos os demais
que fazem parte do mesmo chão.
Mesmo sem
qualquer patrocínio do grande comércio local, o evento será realizado. Negam a
cultura, porém não podem negar a história. O povo sertanejo possui valor infinitamente
maior que qualquer riqueza capitalista. Eles sempre passam, mas a cultura e a
história sempre permanecem vivas.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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