FLOR AO SOL
Rangel Alves da Costa*
A planta nasceu numa estação chuvosa e assim foi crescendo com a beleza do tempo e as forças propícias da natureza. Eram plantas e mais plantas, num verdadeiro jardim espalhado pela aridez do lugar, pois onde elas haviam brotado era terreno acostumado aos gravetos esturricados pelo sol e às pedras fincadas no chão como roseiras petrificadas.
Com o passar do tempo e a estação das mudanças começando a chegar, as plantas foram perdendo a cor, perdendo suas forças e folhas, ficando nuas e se transformando em galhos frágeis e marrons. O vento soprava e ia deixando o terreno vazio, o homem passava e ia pisando no tronco morto que ainda restava. Contudo, nessa paisagem de desolação se podia avistar uma planta que havia sobrevivido a tudo e que irradiava vida como se ali fosse o jardim mais fecundo.
Era, contudo, planta de muitas folhas e somente uma flor. As pessoas que passavam pelo lugar se admiravam e se espantavam com aquela plantinha solitária, toda verdejante e feliz, de uma beleza infinita, ali no meio de onde era impensável poder estar sobrevivendo. E com razão, pois ao redor daquela vida verde só se enxergava a terra rachada pelo sol, os bichos do mato aflitos nas tocas e a feiúra da seca e da desesperança.
Quanto mais a seca se prolongava e o sol chegava mais forte, mais parecia que a plantinha ganhava forças, sem aparecer sequer um tom mais cinzento nos galhos e folhas. Estas balançavam contentes, parecendo dançar para alegrar a flor que brilhava ao sol. Mas qual era realmente a cor dessa flor, que tanto instigava os olhares e colocavam em discussão as pessoas de todas as idades?
O menino dizia que a flor era toda vermelhinha, o homem não tinha dúvida da cor amarelada tendente ao laranja bem forte, já a moça jurava que nunca havia visto uma flor branquinha tão bela quanto aquela. Um senhor de muitos anos disse que flor violeta como aquela era difícil de se ver no sertão. Um poeta das caatingas escreveu um poema sobre a cor rosa da rosa que estava viva num lugar de morte.
Um pintor quis retratar na tela aquela beleza e quase enlouquece com isso: ao amanhecer a flor estava lilás, mais tarde ela enxergava um tom meio azulado e ao entardecer percebeu que a cor era arroxeada. Por três dias seguidos pintou e repintou a florzinha até decidir que não adiantava mudar as tonalidades se a própria flor mudava de flor quando queria. O que fez então foi pintá-la toda branquinha, afirmando para si mesmo que era o único jeito de imaginar a flor na cor que quisesse.
E assim o tempo foi passando e a flor ficando com a cor diferente aos olhos de cada um. Não adiantava, pois todas enxergavam uma cor diferente. Mas a flor já estava cansada de tanto mudar de cor só para alegrar a vida e os olhos dos sertanejos não acostumados à sua existência. Também não estava mais suportando tanto sol sobre si sem que ninguém lembrasse que também precisava de um pouco de água de vez em quando. Sabia que não duraria muito tempo naquela situação. Até que estava acostumada com aquele lugar e com aquelas pessoas interessantes e felizes na dor, mas sabia que as flores também têm os seus instantes de viver e o momento de morrer. Sabia que estava perto do fim e que talvez não durasse nem quatro ou cinco sóis.
Juntou todas as forças que possuía e se fez bela como nunca, e brilhou como nunca e encantou aos olhos e corações como nunca. Sabia que era despedida, que estava próxima sua partida. E então, numa tarde bonita e triste, com o sol já querendo se esconder, apareceu por ali uma casal de namorados que não era do lugar e nem conhecia a história da cor da flor, e a mocinha desejou como nunca que ele lhe presenteasse com aquela flor encantadora.
Num só gesto ele arrancou a flor e ela morreu feliz como nunca.
Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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