*Rangel Alves da
Costa
Cheguei a
Poço Redondo na sexta-feira à noite. Minha ida tinha objetivo específico:
acertar detalhes para a exibição do documentário sobre Zé de Julião, dia 27.
Marquei reunião para o sábado de manhã, no Memorial Alcino Alves Costa, pois
precisava logo definir questões acerca do telão, do projetor, das cadeiras e de
uma tenda.
Das
pessoas convidadas, apenas Manoel Belarmino marcou presença. Como ninguém da
prefeitura compareceu - e aqueles objetos e equipamentos podem ser viabilizados
através da administração municipal - e nenhuma justificativa foi dada, também
nada ficou resolvido. E lavo minhas mãos!
Contudo, a
presença de Belarmino acabou tornando a manhã bastante proveitosa. Com sua
ímpar inteligência, logo estávamos trocando conhecimentos sobre questões
importantíssimas. Dessa vez priorizamos o diálogo sobre a presença e a
importância do negro nos sertões sergipanos.
Dialogamos
sobre as raízes escravas da comunidade da Serra da Guia, seu reconhecimento
como quilombo, suas permanências históricas, seus rituais e tradições. Neste
percurso, chegamos a Barraca dos Negros, cujo nome indica uma presença escrava
já não tão visível nos dias atuais, bem como sobre a família dos Caiano, ainda
de forte presença na região de Sítios Novos.
Ultrapassamos
as fronteiras poço-redondenses e fomos chegar à região de Curituba, em Canindé
do São Francisco, onde lançamos um olhar sobre a Rua dos Negros. E que história
mais interessante a dessa rua! Dentro de um povoado, mas numa área fronteiriça
entre brancos e negros, a existência de uma comunidade quilombola.
Assim, a Rua
dos Negros (que na verdade é uma junção de moradias) ainda hoje abriga
descendentes orgulhosos de escravos, um povo que se reconhece na cor e também
quer ser reconhecido na sua raiz. Fato interessante é que os pais das famílias
“brancas” geralmente impedem que seus meninos passem para o outro lado e ali se
misturem com os negrinhos da Rua dos Pretos.
Desse
modo, a manhã de sábado seria de pouco proveito se não fosse a chegada de
Belarmino e a construção de um diálogo sempre interessante. E diálogo esse que
deveria ser compartilhado por muitas outras pessoas. Para uma ideia do seu
alcance, de repente já estávamos falando sobre a vida ribeirinha e a proteção
das comunidades remanescentes. Falando sobre Curralinho, Bonsucesso e outras
ribeiras.
E por que
outras pessoas, jovens, adultos, estudantes, não chegam para os diálogos dos
sábados? Outro dia, reunidos eu, Belarmino e Val, igualmente cuidamos de temas
importantíssimos para a cultura sertaneja. E o meu desejo é que muitos outros
se juntem a nós para trocas de conhecimentos, para diálogos sobre nossa
realidade, e para rebuscar toda a riqueza de nossa história, cultura e
tradições.
Antes
disso, ainda na sexta à noite, prestigiei o amigo Sávio e sua sanfona mágica,
numa belíssima apresentação no Bar de Orlando, ao fundo da Praça de Eventos. Já
na tarde do sábado, por duas vezes fui ao Bairro São José, onde estava sendo
realizado um evento recreativo, e à noite retornei, já passando das dez, para
acompanhar o início da apresentação de bandas locais. A excelente Robertinha do
Cajueiro ainda cantava quando resolvi retornar.
Caminhando
em direção ao São José, uma moça me avistou e falou que era comigo mesmo que
precisava conversar. Disse-me que necessitava escrever sobre a política
poço-redondense e seu eu poderia ajudar. Respondi que sim e marquei para o
domingo de manhã. Também não compareceu.
Resolvi
então visitar o Reinado de São José, da Rainha Nininha. E para lá segui
caminhando, pela estrada que tanto gosto de andar, lentamente, quase de pés no
chão, conversando com o passado, revivendo tudo, como se eu estivesse ali no
Poço de Cima quando tudo começou. E falando com o mato, com o cacto, com as
areias e as pedras do caminho.
Retornei
logo, já me sentindo gripado. E doente ainda estou. Comprimidos e mais
comprimidos, um monte de remédios. Com o corpo e a cabeça doloridos, hoje deito
cedo, a rede já me espera. Boa noite.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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