*Rangel Alves da Costa
O Grande-Pássaro morreu. E toda a tribo
chorou. Mas desde muito que o pássaro havia deixado de voar. Desde muito que
lentamente morria. Morria nas águas do rio, morria na falta de alimento para a
tribo, morria na perda dos costumes e tradições mais antigas, morria com a
epidemia branca que se alastrava por todo lugar, morria com os modismos tomando
lugar dos antigos rituais e preceitos de vida, morria no forasteiro que chegava
para tudo transformar. Quando o velho cacique reuniu o conselho dos anciãos e relatou
sua preocupação com o sumiço do Grande-Pássaro, toda aquela ancestral sabedoria
já sabia dos tempos difíceis que se abateria sobre toda a tribo. Mas se
avistava o Grande-Pássaro voar? Na brisa do entardecer, no sopro do vento bom,
na copa das árvores tomada de frutos, nos rios límpidos e nas águas piscosas,
na festa tribal, na pintura de urucum sobre a pele, na nudez sem malícia, na
mandioca farta e no beiju assando na brasa. O Grande-Pássaro voando pelas
terras e seus frutos, pelas fogueiras para espantar os maus espíritos, nos
batismos de fogo, na cantiga passarinheira ao alvorecer. Nada disso existe
mais, ou quando existe é um arremedo de existência, pois tudo triste,
lacrimoso, aflitivo. Aquele povo não é mais raiz nem fruto. Até a moradia de
cipó e folha deu lugar ao tijolo e à telha. E o Grande-Pássaro, sem poder voar
e avistar a vida sob suas frestas, simplesmente sumiu. E morreu.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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