*Rangel Alves da
Costa
Sei não,
sei não, mas se engana quem imaginar que muito dinheiro significa poder, luxo,
riqueza, ostentação, esbanjamento, gastanças, brilhos e fanfarronices. Ou que
muito dinheiro permite ser e estar além de todos, como se cada soma fosse um
patamar de uma escada ao alto.
E muito se
engana por que, perante diversas situações, a riqueza ou a fortuna não possui
qualquer valor de transformação da realidade. Quando a doença chama ou a morte
se anuncia, nenhuma valia terão os milhões para a cura imediata ou a forçada
permanência em meio aos humildes, pobres, famintos, ou aqueles sempre relegados
pela submissão social.
E se
engana ainda por que muito dinheiro não significa absolutamente nada sem uma
justa, digna e honrada destinação. Milhões investidos em negócios de risco
valem muito menos que o tostão destinado à boa ação. Bilhões investidos em
ações de bolsas de valores traduzem muito menos que uma ação humanitária em
quantia ínfima para o que se tem.
A riqueza,
além de tender ao distanciamento dos que estão aos pés da escada, provoca uma
solidão tamanha que nem a presença do ouro e da prata acalanta o ânimo
espiritual. E pessoas existem que se pudessem viviam dentro de cofres de bancos
ou caminhando por cima de maços e mais maços de notas. Mas sem amigos, sem
alegria no viver, sem motivos reais para a felicidade e o contentamento.
O Rei
Midas, bondoso e benevolente, por acaso passou a ter imensa riqueza. E assim
porque lhe foi dado o poder de transformar em ouro tudo o que tocasse. Ávido
pelo brilho dourado, o rei foi tornando em preciosidade desde folhas e ramos a
grandes objetos. Já tomado pela ganância, sequer imaginou que se tocasse no seu
próprio alimento ou bebesse vinho ou água, tudo também em ouro se tornaria.
Estava
rico demais, dispondo de todo o ouro que desejasse, mas não podia comer, beber
ou mesmo tocar em alguém que gostasse. O poder do ouro havia se transformado em
perdição. Daí ter implorado para voltar ao estado de antes, de simples humano,
e assim poder viver com normalidade. E provado está que o poder da riqueza ou
de tudo transformar em fortuna não traz nenhuma felicidade.
Qual a
riqueza monetária de Madre Teresa de Calcutá, de Irmã Dulce, de tantas outras e
outros que se revelaram como acolhedores de milhares de pessoas? Porém, ninguém
de maior riqueza que estes, numa bonança nascida de cada doação para a grande
obra da caridade. Se o Rei Salomão teve na sabedoria sua maior riqueza, estes
tiveram na beneficência suas grandes fortunas.
Na lista
dos homens e mulheres mais ricos do mundo, certamente a junção das cifras
sequer se aproximará das riquezas contadas em moedas, em notas de dois e cinco
reais, obtidas da luta dos catadores de papel, de garrafas, de velharias. Por
quê? Ora, o uso e o valor que se dá ao conquistado demonstra o tamanho da
riqueza. A serventia de um ganho no suor e na luta é sempre muito mais
proveitosa que os milhões disponíveis em contas bancárias.
Eu, por
exemplo, sobrevivo ao longe da riqueza monetária, da conta bancária gorda, do
contracheque folgado, do cartão de crédito ilimitado. Tudo o que possuo é de
tamanha luta que nada resta se eu não lutar ainda mais. Mas sou rico. Valorizo
e sei destinar bem o que tenho. Cada tostão conseguido é como se a riqueza
maior do mundo chegasse a minhas mãos.
Ademais,
se muito dinheiro eu tivesse, a única coisa que eu jamais seria era rico. Rico
no sentido de apenas ter, de somar cada vez mais, de ter uma vida regada à
bonança e ao mundanismo. Rico no sentido de deixar de ser o que sou para ser o
outro, o rico, o endinheirado, o que apenas tem sem nada ter, pois não teria
esse tudo que tenho agora.
Na
verdade, se muito dinheiro eu tivesse, a primeira certeza seria que muitas das
pessoas que tão bem conheço não seriam nem mais pobres nem mais ricas do que
eu. Todas seriam iguais a mim, ricas pela minha riqueza, humildes pela minha
humildade. Haveria sempre um pão a ser repartido em partes iguais.
Se muito
dinheiro eu tivesse, mas muito dinheiro mesmo, o meu limite de gasto seria o
limite da necessidade do próximo, daquele próximo a mim e que tão bem eu
conheço. Ou talvez de mais distante, até mesmo desconhecido, pois a carência
que clama não pode ser esquecida.
Mas se
muito dinheiro eu tivesse, certamente algo em mim mudaria: não deixaria faltar
flores sobre a mesa, teria um oratório maior, compraria mais pinhas e araçás.
Teria uma janela aberta para um jardim, um banco de entardecer, uma rede
estendida na varanda, um caderno bonito para rabiscar poesias. Teria o prazer
de abrir a porta e mandar entrar aquele cujo olhar e feição dizem mais que
palavras.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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