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segunda-feira, 1 de março de 2010

NO REINO DO REI MENINO – XXV

NO REINO DO REI MENINO – XXV

Rangel Alves da Costa*


Quando abandonaram o Reino de Oninem em fuga, os pais de Gustavo, Lucius e Lize, procuraram refúgio no primeiro reino que encontraram pela frente. Foram bater precisamente às portas do Reino de Edravoc, governado pelo mal-afamado rei Otnejon, o baixinho.
Na condição de soberano que teve de abandonar seu castelo às pressas, e principalmente pelas grandes riquezas que levava consigo, Lucius e sua esposa não tiveram maiores problemas em serem aceitos, numa espécie de exílio voluntário, no castelo de Otnejon. Este, aliás, ao se certificar da fortuna que o rei foragido carregava logo se incumbiu pessoalmente da tarefa de escolher um aposento confortável para os dois. Na sua concepção, primeiro teria que demonstrar cordialidade e respeito ao ex-soberano de Oninem, dando-lhe conforto e segurança, para depois, com as inevitáveis mudanças na situação, ir aos poucos afanando furtivamente aquela bem-vinda fortuna.
Nos planos do rei de Edravoc, Lucius era uma verdadeira mina em pessoa. Em primeiro lugar porque estava na posse da fortuna roubada do reino, e bem ali no seu castelo, próximo de suas mãos ávidas para roubar também o ladrão. Em segundo lugar porque, enquanto o ex-soberano estivesse ali, poderia usar o seu nome para fazer chantagens perante o seu ex-reino, como se pretendesse dizer que se quisessem na prisão aquele que dilapidou suas riquezas teriam que pagar por isso. Em terceiro lugar porque para ele Lucius não valia nada, a não ser pelo que ainda tinha, e quando deixasse este sem uma só moeda outra coisa não faria senão mandá-lo, juntamente com a esposa, para fora das fronteiras do reino, se pior sorte não lhe destinasse. E ainda porque se pretendesse levar adiante o plano de invadir Oninem, o ex-soberano e sua esposa iriam na primeira fileira das tropas invasoras, erguendo a bandeira de Edravoc. Será que o filho teria coragem de reagir e aniquilar seus pais, principalmente sua mãe?
Tais estratégias se adequavam perfeitamente ao caráter deste mal-afamado governante. Otnejon, o baixinho, como era chamado pela sua estatura de quase anão, era um sujeito nascido mais para ser salteador de estradas do que para se afirmar como soberano de um reino. Não tinha nenhum pudor em querer levar vantagem em tudo, em querer desfazer dos outros, em trair covardemente aquele que estivesse ao seu lado, em mandar para o calabouço aquele seu amigo de um minuto atrás. Com relação aos seus súditos, estes eram tratados como verdadeiros escravos, sem quaisquer direitos ou benefícios que lhes dessem um mínimo de dignidade, e se ousassem negar sob qualquer aspecto a soberania do baixinho não teriam vida longa. Tinham que se contentar com a pobreza absoluta, a humilhação e as perseguições, além de terem que pagar religiosamente os altos tributos reais. Por sua vez, os soldados do reino adaptavam-se perfeitamente às exigências do baixinho porque este lhes garantia uma parte do que era saqueado de outros povos. Assim, quanto mais ferozmente agiam maiores possibilidades tinham de conseguir as abomináveis recompensas.
No castelo desse mal-afamado baixinho, no aposento destinado aos ditos dois novos amigos, que eram Lucius e Lize, uma grande porta foi aberta às pressas, dando passagem para um pequeno solar. Segundo informou o rei, seria para que tivessem maior ventilação e comodidade. Na verdade, a intenção era outra e o casal sabia disso. Tudo aquilo não passava de se encontrar um meio para que a fortuna guardada ali fosse mais facilmente roubada. As desconfianças de Lucius eram muitas e o medo de Lize era ainda maior. Na verdade não gostavam daquele lugar, não queriam permanecer ali e sabiam que teriam de abandoná-lo urgentemente. As suas vidas corriam perigo, o que era pior.
Foi nesse contexto que o emissário enviado ao Reino de Oninem chegou com a tão esperada resposta. Assim que desceu do cavalo foi imediatamente introduzido no castelo, onde ficou aflito aguardando ser recebido pelo rei. Sua aflição tinha razão de ser, vez que sabia que a resposta que levava não era das melhores e por isso mesmo não sabia qual poderia ser a reação dele. Tremeu dos pés à cabeça quando ouviu o tal baixinho falar às suas costas:
- Folgo em vê-lo corajoso mensageiro, mas antes de passar ao que interessa me diga umas coisinhas, pois preciso sorrir muito e alegrar meu coraçãozinho de rei bondoso. O pequenino rei se mijou nas calças quando você deu o meu recado? Ele tava chupando docinho ou brincando de arco e flecha? Ele ainda chupa bico e usa paninhos no bumbum? Ou será que ele ficou chorando o tempo inteiro? Vá, me diga que preciso gargalhar muito.
- O menino rei é um verdadeiro homem meu senhor... – Começou a responder o emissário, todo amedrontado e cabisbaixo.
- Mas o que está me dizendo seu paspalhão, pule essa parte e me diga logo qual a foi a resposta – Esbravejou o baixinho, quase avançando para cima do homem.
Depois dessa abrupta raiva do rei, o emissário não tinha mais dúvidas sobre qual seria o seu destino depois que fizesse o relato. Por isso mesmo se encorajou e começou a dizer tudo com firmeza:
- É isso mesmo o que ia dizendo, o menino rei de Oninem é muito mais homem do que muitos reis que estão por aí e que só tem tamanho, e mil vezes mais homem do que você com o seu mau caráter e tamanho de tamborete...
Olhou para o rei e viu que ele espumava e se retorcia de raiva. Continuou:
- E ele mandou dizer que se quiser a coroa arrume muito dinheiro pra comprar, pois ela está à venda, ou tente invadir o seu reino, que ele está esperando pra fazer de você uma bola de gude. Mas não se preocupe, pois se tiver medo de ir até lá ele mesmo virá até aqui pra aniquilar todo esse reino de vergonha, de...
Não pôde encerrar o que gostaria dizer, pois dois guardas o arrastaram aos pontapés e empurrões.


continua...



Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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